ÁGUA PARA TODOS

UNESP Ilha Solteira - Área de Hidráulica e Irrigação

Fernando Braz Tangerino Hernandez(1)
Vital Pedro da Silva Paz(2)


É fato já aceito a crescente falta de água para a irrigação e outras usos e a discussão sobre o tema alcança toda a sociedade. Para o Secretário da ONU, Ban Ki-moon, “a escassez de água pode ser física, econômica ou institucional e pode flutuar no tempo e no espaço. E cerca de 700 milhões de pessoas, em 43 países sofre de escassez de água, um número que poderá aumentar para mais de 3 bilhões, até 2015” e o Governador José Serra corajosamente admitiu “falando claro: para quase 80% da população de São Paulo, o abastecimento de água não está 100% garantido o tempo inteiro”.

A irregular disponibilidade da água da chuva que alimenta os mananciais, variando ao longo do ano, de ano a ano e de região a região e ainda os seus diferentes usos de forma contínua e indefinida exige ações concretas em diferentes níveis para que tenhamos condições de promover adequadamente o bem-estar social e econômico da população. Na agricultura o uso crescente da irrigação traz a flexibilidade da escolha da época de plantio e segurança de produtividade, mas também o receio da escassez da água.

No mundo 17% das terras sob cultivo é irrigada e respondem por 40% da produção agrícola total mundial. No Brasil 5% da área cultivada irrigada responde por 16% da produção total e por 35% do valor da produção. E com pouco mais de 3 milhões de hectares irrigados e potencial para mais de 30 milhões de hectares, é necessário compatibilizar oferta de alimentos pela irrigação e disponibilidade e qualidade da água.

É certo que o crescimento econômico já não se dá mais de forma autônoma e o conceito de sustentabilidade ligado à preservação do meio ambiente é exigido. A Lei das Águas (9.433/97) disciplina o uso da água e estabelece a Outorga do uso da água como forma de garantia ao usuário e em muitas regiões ainda não se tem conhecimento da real disponibilidade e da qualidade das suas águas e o uso da água especialmente para irrigação deve ser mais eficiente, assim como mecanismos de preservação da microbacia bacia como um todo devem ser adotados com a máxima urgência.

O uso eficiente da água começa na escolha do sistema de irrigação que vai ser implantado, levando-se em consideração as condições locais de solo, clima, planta, recursos hídricos disponíveis, o projeto hidráulico que deve assegurar uniformidade de distribuição de água em toda a área cultivada e equipamentos de qualidade. O melhor sistema de irrigação é aquele que melhor se adequa às condições do local em que vai operar.

Mas o uso eficiente da água também se consegue pela menor quantidade de água aplicada por quilo da produção e o caminho para a eficiência se dá pelo conhecimento da evapotranspiração da cultura, ou seja, a reposição da água consumida no processo de evaporação do solo e transpiração das plantas e se realizando o que chamamos de manejo da irrigação.

O manejo da irrigação, ou seja, a aplicação da água no momento e na quantidade certa pode ser feito via solo (medindo a umidade do solo) ou via atmosfera, quando estações agrometeorológicas estimam o valor da evapotranspiração e este é utilizado diariamente para se calcular o tempo de irrigação.

Diversas instituições fazem estas medições e as divulgam permitindo não somente ao irrigante fazer melhor uso da água, mas também subsidiando ações de planejamento ambiental. A UNESP Ilha Solteira, através da Área de Hidráulica e Irrigação, adota a política de divulgar diariamente as condições agroclimáticas da região noroeste paulista e ainda disponibilizar seus trabalhos de pesquisas em seu Portal, assim como fazem o CIIAGRO-IAC e AGRITEMPO-EMBRAPA-UNICAMP, prestando um grande serviço à modernização da agricultura brasileira. A base para se fazer o uso racional na agricultura está estabelecida, faltando agentes que façam a conversão dos dados em informação que cheguem ao usuário da água.

Na outra ponta temos os mananciais, grande motivo de preocupação, porque são eles que garantem a oferta de água e muitos não possuem mais suas matas ciliares, têm o uso e ocupação do solo sem nenhuma técnica conservacionista e solos arenosos levam à processos erosivos, que resultam em assoreamento, diminuição da vazão e perda de qualidade da água.

Também convém alertar que não mais se discute a indissociabilidade entre práticas conservacionistas, disponibilidade e qualidade de água e saneamento para que a população possa ter saúde e desenvolvimento sócio-econômico.

Ações permanentes de monitoramento dos mananciais, especialmente daqueles onde já se retira água para irrigação e abastecimento urbano e industrial garantem a avaliação da qualidade e disponibilidade de água, abrindo caminho para o desenvolvimento de sistemas de alerta, recuperação e uso racional da água, associado ainda ao monitoramento agroclimatológico da região onde está inserido.

Um dos maiores desafios deste século será a utilização sustentável dos recursos hídricos, renovável, mas finito, situação que envolve técnica, mas um trabalho incansável de educação, transferência de tecnologia, convencimento, conscientização e comprometimento, que levem à conservação e ao melhor uso da água disponível, pois se assim não for pensado, enfrentaremos aqui a pesada realidade de outras regiões, tanto do Brasil, como do mundo.
Afinal, sabendo usar, não vai faltar!

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(1) Fernando Braz Tangerino Hernandez, Engenheiro Agrônomo, Doutor em Irrigação, Professor da Área de Hidráulica e Irrigação da UNESP Ilha Solteira e Chefe do DEFERS.
(2) Vital Pedro da Silva Paz, Engenheiro Agrícola, Doutor em Irrigação, Professor do Departamento de Engenharia Agrícola da Universidade Federal da Bahia.

Exemplo da evapotranspiração de referência (ETo PN-M) divulgada pela UNESP Ilha Solteira diariamente e que permite se fazer a aplicação da água de água na medida certa.

 
Agroind, 04 de maio de 2007
A Voz do Povo, Ilha Solteira, Ano VI, nº 493, 30 de maio de 2007, p.2
Irrigazine, Ano 3, nº7, setembro de 2007
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