É
fato já aceito a crescente falta de água para a irrigação
e outras usos e a discussão sobre o tema alcança toda
a sociedade. Para o Secretário da ONU, Ban Ki-moon, “a
escassez de água pode ser física, econômica ou institucional
e pode flutuar no tempo e no espaço. E cerca de 700 milhões
de pessoas, em 43 países sofre de escassez de água, um
número que poderá aumentar para mais de 3 bilhões,
até 2015” e o Governador José Serra corajosamente
admitiu “falando claro: para quase 80% da população
de São Paulo, o abastecimento de água não está
100% garantido o tempo inteiro”.
A irregular disponibilidade da água da chuva que alimenta os
mananciais, variando ao longo do ano, de ano a ano e de região
a região e ainda os seus diferentes usos de forma contínua
e indefinida exige ações concretas em diferentes níveis
para que tenhamos condições de promover adequadamente
o bem-estar social e econômico da população. Na
agricultura o uso crescente da irrigação traz a flexibilidade
da escolha da época de plantio e segurança de produtividade,
mas também o receio da escassez da água.
No mundo 17% das terras sob cultivo é irrigada e respondem por
40% da produção agrícola total mundial. No Brasil
5% da área cultivada irrigada responde por 16% da produção
total e por 35% do valor da produção. E com pouco mais
de 3 milhões de hectares irrigados e potencial para mais de 30
milhões de hectares, é necessário compatibilizar
oferta de alimentos pela irrigação e disponibilidade e
qualidade da água.
É certo que o crescimento econômico já não
se dá mais de forma autônoma e o conceito de sustentabilidade
ligado à preservação do meio ambiente é
exigido. A Lei das Águas (9.433/97) disciplina o uso da água
e estabelece a Outorga do uso da água como forma de garantia
ao usuário e em muitas regiões ainda não se tem
conhecimento da real disponibilidade e da qualidade das suas águas
e o uso da água especialmente para irrigação deve
ser mais eficiente, assim como mecanismos de preservação
da microbacia bacia como um todo devem ser adotados com a máxima
urgência.
O uso eficiente da água começa na escolha do sistema de
irrigação que vai ser implantado, levando-se em consideração
as condições locais de solo, clima, planta, recursos hídricos
disponíveis, o projeto hidráulico que deve assegurar uniformidade
de distribuição de água em toda a área cultivada
e equipamentos de qualidade. O melhor sistema de irrigação
é aquele que melhor se adequa às condições
do local em que vai operar.
Mas o uso eficiente da água também se consegue pela menor
quantidade de água aplicada por quilo da produção
e o caminho para a eficiência se dá pelo conhecimento da
evapotranspiração da cultura, ou seja, a reposição
da água consumida no processo de evaporação do
solo e transpiração das plantas e se realizando o que
chamamos de manejo da irrigação.
O manejo da irrigação, ou seja, a aplicação
da água no momento e na quantidade certa pode ser feito via solo
(medindo a umidade do solo) ou via atmosfera, quando estações
agrometeorológicas estimam o valor da evapotranspiração
e este é utilizado diariamente para se calcular o tempo de irrigação.
Diversas instituições fazem estas medições
e as divulgam permitindo não somente ao irrigante fazer melhor
uso da água, mas também subsidiando ações
de planejamento ambiental. A UNESP Ilha Solteira, através da
Área de Hidráulica
e Irrigação, adota a política de divulgar diariamente
as condições agroclimáticas
da região noroeste paulista e ainda disponibilizar seus trabalhos
de pesquisas em seu Portal,
assim como fazem o CIIAGRO-IAC
e AGRITEMPO-EMBRAPA-UNICAMP,
prestando um grande serviço à modernização
da agricultura brasileira. A base para se fazer o uso racional na agricultura
está estabelecida, faltando agentes que façam a conversão
dos dados em informação que cheguem ao usuário
da água.
Na outra ponta temos os mananciais, grande motivo de preocupação,
porque são eles que garantem a oferta de água e muitos
não possuem mais suas matas ciliares, têm o uso e ocupação
do solo sem nenhuma técnica conservacionista e solos arenosos
levam à processos erosivos, que resultam em assoreamento, diminuição
da vazão e perda de qualidade da água.
Também convém alertar que não mais se discute a
indissociabilidade entre práticas conservacionistas, disponibilidade
e qualidade de água e saneamento para que a população
possa ter saúde e desenvolvimento sócio-econômico.
Ações permanentes de monitoramento dos mananciais, especialmente
daqueles onde já se retira água para irrigação
e abastecimento urbano e industrial garantem a avaliação
da qualidade e disponibilidade de água, abrindo caminho para
o desenvolvimento de sistemas de alerta, recuperação e
uso racional da água, associado ainda ao monitoramento agroclimatológico
da região onde está inserido.
Um dos maiores desafios deste século será a utilização
sustentável dos recursos hídricos, renovável, mas
finito, situação que envolve técnica, mas um trabalho
incansável de educação, transferência de
tecnologia, convencimento, conscientização e comprometimento,
que levem à conservação e ao melhor uso da água
disponível, pois se assim não for pensado, enfrentaremos
aqui a pesada realidade de outras regiões, tanto do Brasil, como
do mundo.
Afinal, sabendo usar, não vai faltar!
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(1) Fernando Braz
Tangerino Hernandez, Engenheiro Agrônomo, Doutor
em Irrigação, Professor da Área
de Hidráulica e Irrigação da UNESP Ilha Solteira
e Chefe do DEFERS.
(2) Vital Pedro da Silva Paz,
Engenheiro Agrícola, Doutor em Irrigação, Professor
do Departamento de Engenharia Agrícola da Universidade Federal
da Bahia.
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