EXPANSÃO URBANA DEGRADA 88% DA MATA CILIAR

 

Diego Zanchetta

Os mananciais que compõem a Bacia do Rio Piracicaba registraram nas últimas cinco décadas a degradação de 88% de suas matas ciliares, resultado da expansão desordenada de indústrias, de condomínios e de propriedades rurais ao longo das margens dos rios que abastecem 3,9 milhões de pessoas em 61 municípios do interior.
No lugar da floresta, que evita a erosão e o consequente assoreamento dos rios, estão hoje agricultores e complexos residenciais que captam cerca de 15% do volume de água da Bacia do Piracibaca, apontam dados do Sindicato Rural de Campinas e Região e do Consórcio Intermunicipal da Bacia dos Rios Piracibaca, Capivari e Jundiaí (CI-PCJ).
A quinta matéria da série que aborda os problemas de abastecimento na Região Metropolitana de Campinas (RMC) mostra como a destruição da mata ciliar dos rios da região ameaça reduzir o volume de água que chega aos reservatórios do Sistema Cantareira, complexo que fornece água para 14 milhões de pessoas na Grande São Paulo e no Interior. Hoje, o CI-PCJ estima que seja necessário o plantio de 200 milhões de mudas para cobrir o déficit vegetal nas margens da Bacia do Piracicaba.
A degradação da floresta nas margens dos mananciais acarreta, ao longo do tempo, a diminuição do volume de água que entra nos reservatórios, uma vez que a flata de cobertura vegetal durante os períodos de chuva resulta no assoreamento dos rios.
Segundo um estudo realizado pelo Centro de Energia Nuclear da Universidade de São Paulo (USP), 61% da área que circunda o reservatório Jaguari-Jacareí, o maior Sistema Cantareira, responsável por fornecer 20 mil litros de água por segundo (66% do total de água do Cantareira), está ocupada de forma irregular.
"Apesar de algumas áreas serem protegidas pela legislação ambiental, as prefeituras aprovam a instalação de construções que acabam degradando a mata ciliar dos rios", detalhou o coordenador de reflorestamento do CI-PCJ, Fernando Vitti.
Nas regiões de Itatiba e de Bragança Paulista, por exemplo, o Rio Atibaia, responsável por abastecer 95% da população de Campinas, teve suas margens ocupadas por propriedades agrícolas, hotéis, condomínios de luxo e indústrias de celulose.
Na pequena porção de mata ciliar que ainda resta, existe uma fauna de esquilos e borboletas que resiste em meio ao avanço urbano. O mesmo cenário de degradação é presenciado nas margens do Rio Jaguari, entre as cidades de Pedreira e Amparo. "Com a saturação do mercado imobiliário de Campinas, muitas pessoas vieram morar nos condomínios na beira do Rio Atibaia em Itatiba e Bragança", comentou o médico campineiro Ricardo Capolice, 48 anos, que costuma nas horas de folga fazer caminhadas ao longo da mata ciliar que sobrou do Rio Atibaia próximo à Bragança Paulista.

CÓDIGO FLORESTAL
O Código Florestal etabelece como área de preservação permanete a faixa de 100 metros antes de chegar ao leito dos rios. A área de preservação pode cair para até 30 metros em casos de córregos e riachos.
Na contramão da legislação, porém, as prefeituras, para não abrirem não na arrecadação de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), aprovam as construções nas margens dos mananciais, como pode ser observado ao longo dos rios Atibaia, em Itatiba, e no Jaguari, próximo à Cosmópolis. "A aprovação desses empreendimentos acaba resultando na destruição das matas ciliares", completou Vitti.

 
RIOS ATIBAIA E JAGUARI RECEBERÃO NOVAS MUDAS
Para tentar minimizar a degradação ambiental dos mananciais da região, o Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracibaca, Capivari e Jundiaí (CI-PCJ) vai investir R$ 330 mil no plantio de novas mudas ao longo dos rios Atibaia e Jaguari a partir de 2005.
Desde 1991, o CI-PCJ já plantou 1,8 milhão de mudas ao longo das bacias dos Rios Piracicaba e Corumbataí. O déficit de cobertura vegetal nas matas ciliares dos rios da região é estimado pelo CI-PCJ em 200 milhões de mudas.
Além de favorecer a infiltração da chuva nos lençois freáticos e de evitar o assoreamento de rios, a mata ciliar também serve como "corredor biológico" para a fauna que ainda sobrevive às margens dos mananciais da região. "Ao longo da Bacia do Piracicaba, existem espaços nas margens sem cobertura vegetal de até 10 quilômetros. Alguns animais não conseguem percorrer essa distância e o reflorestamento é necessário para interligar esses fragmentos de florestas distantes entre si", explicou o biólogo Renato Fercundini.
O Sindicato Rural de Campinas e Região reconhece que os agricultores consomem de 10% a 15% do volume de água da Bacia do Rio Piracicaba. A entidade, porém, disponibiliza engenheiros agrônomos para orientar os produtores rurais a promoverem o reflorestamento das margens dos rios onde eles estão instalados. "Para conservar a mata ciliar, nós orientamos os agricultores a manter a proteção vegetal nas margens dos rios. Hoje, o desperdício de água nas redes de abastecimento é muito maior que o volume captado pelos agricultores", apontou Antônio Crestana, presidente do sindicato. (DZ/AAN)
 
Correio Popular, Campinas/SP, Ano 76, nº 23.970, 25 de Março de 2004, p. 1 e 7



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