CICLO NOS EUA CRIA 
`NOVA ECONOMIA´
AUTOR: Malu Gaspar 

   
 
Evolução tecnológica estaria na base do crescimento sem precedentes vivido atualmente pelo país
           Inflação baixa, pleno emprego, nenhum sinal de recessão e ainda por cima uma evolução tecnológica sem precedentes. Nos Estados Unidos, onde a economia 
           cresce há mais de cem meses sem interrupção, os cidadãos comuns comemoram a prosperidade enquanto economistas, analistas financeiros, acadêmicos e governantes tentam explicar o que está acontecendo. 
           Com as recentes revisões nos indicadores econômicos todas sempre atualizando os números para cima e indicando um crescimento ainda maior do que se imaginava-, ganham força os partidários do que vem sendo chamado de "Nova Economia", teoria que é a nova coqueluche do mundo financeiro norte-americano. 
           Sob essa denominação está a tese de que os Estados Unidos vivem uma nova etapa do capitalismo, em que a evolução tecnológica e dos sistemas de informação estariam na origem da queda da inflação -que está em 1,1% ao ano, em 99- e das baixas taxas de desemprego -4,1% da População Economicamente Ativa, segundo os últimos dados do governo. 
           Isso porque os avanços tecnológicos teriam proporcionado uma tal queda nos preços da produção que a partir de agora seria possível aumentar   progressivamente a produtividade e o consumo sem aumentar os preços dos produtos. 
           E como a tendência é a tecnologia continuar sendo aprimorada, a economia teria então começado a funcionar a partir de um novo patamar, sem mais riscos 
de surtos inflacionários ou de recessão. "A evolução tecnológica é um fato, mas os Estados Unidos eventualmente também vão ter recessão. É errado relacionar a inflação baixa com a tecnologia, como se uma fosse consequência da outra", diz o 
professor da Universidade de Princeton e especialista em mercados financeiros José Scheinkman. "Essa é uma idéia de muita aceitação nos mercados 
           financeiros, que estão ganhando dinheiro com o crescimento do setor tecnológico. Mas quem apostar nessa idéia para especular com ações vai acabar 
           perdendo muito dinheiro", afirma ele.

Influência tecnológica
           Uma revisão de indicadores econômicos desde a década de 50, divulgada em outubro, mostrou que o crescimento da produtividade dos Estados Unidos na 
década de 90 foi de 2% ao ano, e não de 1,5%, como havia sido calculado antes. O índice só não é maior do que o da década de 60, quando houve a maior média anual de crescimento da história do país, de 2,5%. Desde então, alguns estudos têm tentado analisar qual a influência do setor tecnológico sobre os índices gerais. 
           Embora cheguem a resultados diferentes, todos levam a crer que foi um fator muito importante, mas ainda não há consenso sobre o quanto desse crescimento do setor tecnológico contaminou os outros setores. 
           Paul Romer, professor de economia da Universidade de Stanford, no Estado da Califórnia, afirma que, pelo menos sobre o mercado de trabalho, a influência foi imensa. 
           "O fato de a tecnologia estar presente em tantas atividades econômicas está gerando uma mudança profunda no mercado de trabalho, em que os empregos não são mais estáveis. Embora nos níveis mais baixos ainda haja essa estabilidade, a tendência é que, no futuro, sejamos todos consultores, trabalhando por projetos, e não mais por mês", afirma Romer. 


 
 
Força do mercado seria a explicação, diz professor
           O professor Paul Romer, da Universidade de Stanford, na Califórnia, está no centro da revolução tecnológica nos Estados Unidos, o Vale do Silício, berço da Microsoft, Netscape e outros grandes do setor. 
           Para ele, que estuda teorias de crescimento econômico há 15 anos, há efetivamente uma grande revolução tecnológica em curso. Mas isso não quer dizer que não vá haver mais recessão ou que não é preciso mais ter preocupações com a inflação. 
           Romer, eleito no ano passado pela revista "Time" como uma das 25 pessoas mais influentes dos EUA, prefere acreditar na força da economia de mercado. 
           A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha, por telefone, na semana passada.
           Folha - O senhor é partidário da tese de que os EUA vivem uma "Nova Economia"? 
           Paul Romer - Quando as pessoas falam em nova economia, elas se referem a pelo menos dois fenômenos diferentes: um é o cenário de baixas taxas de inflação e 
de desemprego. O segundo é uma onda significativa de crescimento das atividades relacionadas à tecnologia. Esses dois fenômenos acabam sendo colocados juntos     sob o título de "Nova Economia", e algumas pessoas asseguram que há uma relação causal entre os dois. 
           Acho essa afirmação muito questionável. Nós não sabemos ao certo por que a inflação tem estado tão amortecida. É muito claro que a inflação está baixando            em todo o mundo. Então, não é um fenômeno especificamente norte-americano.
           Folha - E para a revolução tecnológica, ela é única nos EUA? 
           Romer - Sim. A onda tecnológica parece ser mais específica dos EUA. Penso que tanto o desemprego baixo como a onda tecnológica estão relacionados com uma característica-chave da economia norte-americana, que é o fato de nós termos aderido ao mercado mais do que qualquer outra economia no mundo. Nós deixamos o processo do mercado operar. Se isso quer dizer que uma empresa vai ter que fechar seus negócios, nós deixamos ela fazer isso. É importante ressaltar que há empresas falindo todos os dias nos EUA, e há demissões em massa todos os meses. Centenas de milhares de pessoas perdem seus empregos todos os           dias. E nós permitimos que isso aconteça, mas, ao mesmo tempo, há sempre novos empregos sendo criados. E o que temos visto é que, se você deixa o mercado operar livremente, muitas coisas boas podem sair disso.
           Folha - Mas essa fórmula funcionaria também para os países subdesenvolvidos, onde as condições sociais e o avanço tecnológico estão num patamar bem diferente? 
           Romer - Há dois tipos de conclusões a que as pessoas podem chegar. Alguns pensam: "a economia de mercado só vai funcionar se tivermos evoluído tecnologicamente; então, vamos primeiro tentar acompanhar o avanço         tecnológico, e só aí deixar os mercados operarem livremente". Mas isso leva ao oposto, porque se o mercado avança, não é a tecnologia o fator necessário           para que ele funcione. Acho que é preciso confiar na experiência norte-americana. Se você deixar o mercado operar, terá tanto os benefícios para o mercado de trabalho como um rápido avanço tecnológico. Outras economias em desenvolvimento fizeram isso e se deram muito bem, como Cingapura.
           Folha - E quais seriam os efeitos dessa nova conjuntura norte-americana sobre as economias dos países que ainda não implementarem um modelo
como o que o senhor sugere? 
Romer - Eles correm um sério risco de ficar ainda mais para trás, enquanto o resto do mundo cresce. Há muitos países, por exemplo, que têm inflação sob controle, não sofrem uma recessão muito séria e nem crises cambiais. 
           Você pode ter tudo isso e mesmo assim ter desemprego allto, ou ainda um crescimento de renda muito lento. Na minha opinião, esses problemas poderiam ser 
superados se esses países abrissem mais suas economias para o mercado. (MG)