LIXO NÃO É LIXO

Marçal Rogério Rizzo

Todos sabemos que a falta de trabalho acaba paralisando a sociedade. Onde há falta trabalho, sobram problemas socioeconômicos, como a violência, o alcoolismo e a miséria, entre outros. Em um período de crise econômica e desemprego, temos que analisar tudo o que nos rodeia, visando a uma alternativa para a geração e a complementação de renda. Isso inclui até mesmo o lixo que produzimos em nossas residências. Parece estranho alguém dizer que o lixo poderá ser uma alternativa para a geração e a complementação de renda. Afinal de contas, lixo é lixo. Que valor poderemos dar a algo que não nos serve mais? Diante desse pensamento, que está impregnado na cabeça da maioria da população, que acha que o lixo não vale mais nada, vamos justificar a afirmação de que o lixo poderá se transformar em renda. Você tem idéia da quantidade de lixo produzida no Brasil todos os dias? Segundo os dados de um estudo feito pelo Compromisso Empresarial para a Reciclagem (Cempre), são produzidas no Brasil aproximadamente 240 mil toneladas diariamente, e o fator agravante é que 76% desse lixo não passam por qualquer gerenciamento, sendo despejados nos aterros a céu aberto e, na maioria das vezes, afetando o equilíbrio do ecossistema.
Outro dado interessante é que apenas 2,5% das cidades brasileiras separam parte de seu lixo urbano. O economista Sebetai Calderoni, em seu livro "Os bilhões perdidos no lixo", afirma que o Brasil perde anualmente R$ 5,8 bilhões porque deixa de reciclar o seu lixo urbano, deixando claro que nosso lixo vale muito e pode ser uma alternativa de renda para muitas pessoas que se encontram desempregadas e até mesmo excluídas do meio social. A reciclagem de lixo tem se revelado um bom negócio. Países desenvolvidos, como a Austrália e o Japão, já reciclam praticamente 100% do lixo que produzem. Os Estados Unidos são o país que produz mais lixo no mundo, e parte desse lixo é reciclado, empregando milhares de pessoas nesse processo. Outro aspecto que temos que levar em conta é que a reciclagem, além de propiciar trabalho e renda a muitas pessoas, faz muito bem ao meio ambiente, deixando-o mais limpo e evitando o desperdício e a extração de materiais.
Um exemplo interessante a ser dado é o caso do alumínio. A cada tonelada de alumínio reciclada, é evitada a retirada de 5 toneladas de minério de bauxita, sem dizer que o processo de transformação do minério em alumínio consome muita energia. Para se ter uma idéia do que isso significa para a natureza, o consumo de latas de alumínio no Brasil neste ano deverá ser de 9,5 bilhões de unidades, e no mundo, de 220 bilhões. Cada quilo de alumínio produz apenas 67 latas. Imagine se não houvesse a reciclagem desse material. Em pouco tempo, não teríamos mais alumínio no mundo. Já com relação à embalagem longa vida (do leite, do suco e de outros produtos), cada tonelada reciclada gera cerca de 650 quilos de papel kraft, o que evitará o corte de 20 árvores cultivadas em reflorestamento comercial. Agora, indo para o lado prático, os pontos que acredito serem essenciais são o incentivo do poder público e a criação de cooperativas que possam acomodar as pessoas que trabalham na coleta de materiais recicláveis, dando a elas melhores condições de trabalho. O investimento em campanhas de conscientização, alertando a população para a importância da coleta seletiva e da reciclagem do lixo, lembrando que o ele poderá se tornar renda para outras pessoas e a promoção de educação ambiental, focalizando a teoria dos três "r" (reduzir, reutilizar e reciclar) também são importantes.

Marçal Rogério Rizzo
Economista, especialista em economia do trabalho, mestrando no Instituto de Economia da Unicamp

Diário da Região, São José do Rio Preto, 25 de janeiro de 2002, p.A-3



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