Depois
de ser praticamente extinta na década de 80 por causa da ação
indiscriminada do homem com pastagens e hortas, a mata ciliar do rio
Preto está em recomposição. Dessa forma, vem contribuindo
para a purificação e aumento no volume da água
do rio, evitando o assoreamento, melhorando o clima da cidade e servindo
de abrigo para espécies de aves e animais nativos. Atualmente,
biólogos classificam a cobertura vegetal do rio Preto como em
estágio inicial de recuperação.
Sua composição é de cerca de 70% de espécies
pioneiras, que são as plantas que surgem na primeira fase da
recuperação. A regeneração ocorre há
pelo menos 20 anos. O trecho do curso d’água que apresenta
recuperação da mata mais evidente é aquele após
o encontro com as águas do Piedade, na região da Vila
Elmaz e Jardim Helena. Apesar do rio estar tomado pela poluição,
causada pelo despejo de esgoto in natura e lixo doméstico, na
mata ao seu entorno é possível encontrar espécies
nativas, como ingás, açoita-cavalo, jenipapo, sangra-d’água,
embaúba e outras.
Algumas medidas foram
adotadas pela Polícia Ambiental, com objetivo de contribuir para
a recuperação da vegetação nativa, como
o cercamento da área com arame farpado, que impede a entrada
de gado, a retirada de hortas e as ocupações clandestinas.
O gado é um dos principais destruidores da vegetação.
Ao pastar, os animais pisoteiam o solo, matando e impedindo o crescimento
de árvores e plantas. A recuperação da vegetação
é confirmada pelo tenente Olivaldi Azevedo, comandante da Polícia
Ambiental de Rio Preto. “Não é o ideal ainda, mas
posso dizer que a mata nesse trecho, após o Piedade, está
em um nível de recuperação muito bom”, diz.
“Fizemos um
trabalho de remoção das hortas e pastagens do local. Alguns
proprietários foram autuados e outras foram retiradas por meio
de negociação”, afirma o tenente, que diz que a
fiscalização acontece, em média, uma vez por mês.
A recuperação
da vegetação do rio Preto já entra em uma segunda
fase. O desenvolvimento das espécies pioneiras propiciam sombra
e umidade a um banco de sementes que fica “hibernado” no
solo. Dessa forma, esse banco é reativado e já começam
a aparecer na área espécies secundárias como tapirira
(Tapirira guianensis), marinheiro (Guarea guidonea), pimenta-de-macaco
(Xylopia aromatica), além das plantas herbáceas, como
o lírio-do-brejo (Hedychium coronarium). “Condições
favoráveis como sombra, umidade, nutrientes e camada orgânica,
oferecidas pelas espécies pioneiras da mata, deixam o ambiente
propício para o surgimento de espécies secundárias”,
explica a bióloga Valéria Stranghetti, coordenadora do
Núcleo de Estudos Ambientais (NEA) da Unirp.
A mata do rio Preto é considerada secundária por já
ter sofrido ação do homem. Trechos intocados da Amazônia,
por exemplo, são considerados primários. “A mata
do jeito que está mostra um processo de recuperação
muito grande”, diz a pesquisadora. Além
da flora, a fauna aos poucos se recompõe e dá nova vida
a um trecho antes condenado do rio Preto. Tucanos, gaviões, ratos
do banhado, roedores, sapos, cobras e outros animais voltaram a habitar
e freqüentar o trecho, segundo relatos de moradores do local. “Os
frutos e as flores das árvores nativas atraem a fauna, como as
aves, que contribuem para polinizar e espalhar as sementes por meio
da defecação”, diz a bióloga, com doutorado
em botânica pela Unicamp e especialista em matas ciliares. Uma
multa aplicada pela Polícia Ambiental à Prefeitura de
Rio Preto é outro fator que contribuiu para a recuperação
gradual da mata, porque levou a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)
firmado entre o Poder Público Municipal, a promotoria do Meio
Ambiente e Polícia Ambiental.
Autoproteção
A Secretaria de Meio Ambiente de Rio Preto diz que nenhuma ação
pontual, como o reflorestamento, foi feita para recuperar a mata do
local. “Ela se recuperou sozinha”, diz o secretário
de Meio Ambiente, José Carlos de Lima Bueno. Bueno aponta dois
motivos que considera os responsáveis pela recuperação
do trecho de mata ciliar do rio Preto. O primeiro é a legislação
de parcelamento do solo, de 1984, que determina uma faixa de 150 metros
do rio para a construção e intervenções
urbanas. “Com isso, houve uma recuperação natural,
pois a área passou a ser preservada”, diz o secretário.
O segundo motivo para a recuperação da mata apontado por
Bueno é no mínimo curioso. “Como o rio é
poluído e tem um mau-cheiro tremendo, ninguém chega perto.
É como uma auto-proteção do rio”, afirma.
LEIS AMBIENTAIS PROTEGEM MARGENS
A legislação ambiental determina que um rio como o Preto
deve ter área protegida, livre da intervenção humana,
de 150 metros a partir do leito, sem hortas e currais. Apesar da lei
em vigor, com punição de seis meses a uma ano de detenção
e multas que podem chegar a R$ 7,5 mil, a reportagem do Diário
constatou que montes de entulho são despejados próximos
ao leito do rio. “O entulho compacta o solo, impedindo o crescimento
da vegetação”, diz a bióloga Valéria
Stranghetti. Outra conseqüência da ação do
homem são os trechos tomados por erosões e cascalhos,
o que também impede a proliferação da vegetação.
O tenente da Polícia Ambiental Olivaldi Azevedo diz que tem conhecimento
do despejo clandestino de entulho na área, mas que é difícil
flagrar os infratores. “Nessas áreas pequenas, o entulho
é despejado rapidamente por carroceiros, que logo desaparecem.
Isso torna difícil a fiscalização”, admite
Azevedo. Mesmo
com a legislação ambiental e de parcelamentro do solo
que protege as matas ciliares, e com as fiscalizações
de rotina da Polícia Ambiental, a ação depredatória
do homem ainda pode ser flagrada no local. Diversos despejos clandestinos
de esgoto são vistos ao longo do curso d’água. O
lixo está presente nas margens e presos às galhadas das
árvores. Algumas hortas e currais também são vistos
próximos às margens, o que compromete a recuperação
e desenvolvimento da mata ciliar.
DESCUIDO INCOMODA MORADOR
Nas margens do rio Preto, a ausência de manutenção
como corte do mato, construção de calçadas e tratamento
de esgoto, aliada à falta de consciência ambiental da população,
faz com que moradores das áreas próximas à mata
ciliar disparem uma série de críticas à Prefeitura.
E até mesmo à natureza. É o caso do aposentado
Fioravante Russini, que mora há 22 anos na Vila Elmaz.
A reclamação dele é relacionada ao mau-cheiro causado
pelo esgoto despejado no rio e à quantidade de pernilongos e
outros bichos que existem na área. “Tem um monte de cano
de esgoto arrebentado aqui. Quando a gente está comendo bate
aquele mau-cheiro. E para dormir então? Ninguém consegue
por causa dos pernilongos que infestam esse lugar”, diz.
O aposentado
afirma que, se pudesse, cortaria toda a mata e plantaria grama, como
era há alguns anos, quando chegou ao bairro. “Antigamente
não tinha essa floresta (referindo-se a mata ciliar). Só
não faço isso (cortar tudo) porque depois vem multa da
Polícia Ambiental.” O morador chegou a ter horta e gado
na margem do rio, há cerca de 20 anos. Foi obrigado a tirar a
criação e interromper o plantio. “A indignação
dos moradores reflete a falta de atendimento do Poder Público”,
avalia a bióloga Valéria Satranghetti. Ela acompanhou
a equipe do Diário até o local e constatou a recuperação
da mata ciliar do rio Preto.
Valéria sugere medidas como colocação de alambrados
separando a mata, construção de calçadas e fiscalização
maior em relação ao despejo clandestino de esgoto, lixo
e entulho, para amenizar as críticas e solucionar os problemas.
“Se eu morasse aqui, também reclamaria”, diz. Para
ela, o ideal seria um trabalho conjunto entre universidade, Polícia
Ambiental, Prefeitura e comunidade, em prol do ambiente. |