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Agricultura Irrigada: produtividade, segurança alimentar e sustentabilidade
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Plano de irrigação prevê 11,2 milhões de hectares em dez anos
De acordo com os resultados da “Análise Territorial para o Desenvolvimento da Agricultura Irrigada”, promovida pelo Ministério da Integração Nacional, o Brasil possui 6,1 milhões de hectares irrigados. Conduzido em parceria com a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) e o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), o estudo demonstra um potencial de expansão que pode atingir 61 milhões de hectares, aumentando dez vezes o tamanho atual.
Promovendo elevação da produtividade, maior valor agregado da produção, redução das perdas na safra, diminuição da pressão pelo desmatamento de novas áreas e geração de emprego e renda, a agricultura irrigada nacional apresenta desenvolvimento expressivo nos últimos 50 anos. Dados do IBGE e da Agência Nacional de Águas (ANA) mostram uma taxa média de crescimento anual entre 4,4% e 7,3% ao ano. Aproximadamente 68% da área irrigada se concentra nos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia e Goiás.
Em março deste ano, a Câmara Setorial de Equipamentos de Irrigação da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) divulgou números que demonstram um aumento de 218,5 mil hectares na área irrigada no Brasil em 2016. O incremento de 4% em relação ao ano anterior se deve ao crescimento do uso de equipamentos pivôs centrais nas propriedades. O aumento registrado foi de 105 mil hectares, equivalentes a 36,4%, comparado à utilização do mesmo sistema em 2015.
Um relatório da Embrapa revela que existem cerca de 20 mil pivôs centrais irrigando uma área de 1,275 milhão de hectares em todo o país, indicando um crescimento de 43% no uso da tecnologia entre 2006 e 2014. Além disso, o pivô central é o sistema mais outorgado pela Agência Nacional de Águas, responsável pela concessão do direito de uso de recursos hídricos em corpos d’água da união.
Plano de Irrigação
A Associação dos Irrigantes do Estado de Goiás (Irrigo), divulgou, no dia 25 de julho, que o Plano para Expansão, Aprimoramento e Desenvolvimento Sustentável da Agricultura Irrigada no Brasil, apresentado pelo Ministério da Agricultura (Mapa), prevê uma expansão de 5 milhões de hectares de área irrigada nos próximos 10 anos, atingindo a marca de 11,2 milhões de hectares.
O intuito é aumentar a produtividade de 3,4 para 4 toneladas por hectare, gerar até 7,5 milhões de empregos diretos e indiretos, promover o uso racional da água e minimizar perdas agrícolas devido a problemas climáticos. O projeto também contempla a diminuição da pressão sobre a abertura de novas áreas de produção e incentivo a investimentos em tecnologias de produção sustentável.
Na primeira fase, o plano deverá promover a ampliação da área irrigada no país em 1,5 milhão de hectares até 2019; promover a implantação de três centros de referência em agricultura irrigada; capacitação de 20 mil produtores e técnicos; implementação do Cadastro Nacional de Irrigantes; e a implantação de 50 unidades demonstrativas.
Marcos Tessler, diretor da área de desenvolvimento de negócios da Netafim e presidente da CSEI da Abimaq, enfatiza a importância do órgão como representante das indústrias do setor frente às políticas destinadas ao fomento da irrigação e às questões ligadas à energia elétrica no país. Ele afirma que mesmo com a crise e as restrições de financiamento, o crescimento do mercado aponta para a expansão contínua do segmento.
“Está provado que a irrigação é uma das técnicas mais importantes para o aumento de produção e produtividade no campo, e o mercado já entende. A tendência num país tão grande é verticalizar um pouco mais a produção, produzindo mais por unidade de área e baixar o custo, que são os grandes benefícios da irrigação aumentando muito a rentabilidade do agricultor”, explica.
Doutor em engenharia agrícola, Tessler discorre sobre os benefícios econômicos e o retorno de investimento viabilizado pela adoção da agricultura irrigada, analisando a vocação natural da tecnologia para diminuir o custo de produção e aumentar a produtividade regionalmente.
“É preciso dividir o Brasil em três grandes blocos para considerar os diferentes grandes climas regionais. No Nordeste não existe possibilidade de uma agricultura moderna e sustentável sem irrigação, o clima demanda muita água, as condições são extremas. E as culturas respondem muito bem porque existe muita luminosidade e calor. No Sudeste tem índice pluviométrico melhor, existe uma agricultura não irrigada. Mas quando se irriga os resultados também aparecem, a produção aumenta pelo menos em 40, 45% até mais. Com as mudanças climáticas, o risco, mesmo no Sudeste, de não irrigar é muito alto. O terceiro bloco é o Centro- Oeste, que hoje paga a conta do Brasil, com o agronegócio brasileiro, a produção de soja e milho, também se beneficia muito da irrigação com a mesma margem de elevação de produtividade do Sudeste. Hoje, a gente irriga pomares de maçã no Rio Grande do Sul, Santa Catarina; uva no Sul, no Vale do São Francisco, melão e frutas tropicais no Nordeste; café e laranja em São Paulo e os grãos no Centro-Oeste. O tempo de retorno do investimento em geral é de 2 a 4 anos. Há cultivos de ciclo muito curto como o melão, onde o retorno é mais rápido e há cultivos como manga e uva em que o retorno é um pouco mais demorado”, comenta.
Considerada imprescindível para a segurança alimentar interna, a agricultura irrigada é responsável pela estabilidade da produção anual de alimentos. Fernando Braz Tangerino Hernandez, pesquisador e professor da Unesp Ilha Solteira, analisa o cenário nacional e compara as diferenças entre o panorama da irrigação no Brasil e no exterior.
“Temos, na agricultura irrigada, o que chamamos de efeitos multiplicadores, porque se emprega mais, se compra mais, se vende mais e assim há mais alimento à disposição da população e se distribui oportunidades socioeconômicas para um município, uma região, um estado e um país. Nas áreas irrigadas há dois sistemas de proteção envolvidos: para a população, a oferta constante de alimentos leva a uma previsibilidade da produção de alimentos e a sua oferta, mantendo os preços com menor flutuação, ao passo que para os irrigantes, com possibilidades de produtividade próxima do potencial de cada espécie ou variedade, faz com que sobreviva no negócio, mesmo quando os preços estão baixos, pois ele tem produtividade alta. No Brasil, o nosso desafio é o de aumentar a área irrigada distribuindo oportunidades pelos efeitos proporcionados pelos sistemas de irrigação e a segurança hídrica. Enquanto na Europa, China, Índia e Estados Unidos o desafio é manter as áreas irrigadas, não diminuindo-as face a escassez de água, na quantidade e qualidade. O negócio da produção de alimentos é o mais sujeito a lei da oferta e procura e a dependência climática força uma intensa movimentação da gangorra dos preços”, analisa.
Quanto ao desdobramento adverso das implicações ambientais negativas da irrigação, que segundo pesquisas amplamente divulgadas, utiliza cerca de 70% da água disponível no planeta, o professor Tangerino propõe outro prisma para o tema. Especialista na matéria, ele considera o campo também como local ideal para o armazenamento da água. Além disso, salienta a viabilidade do reuso da água dos efluentes agroindustriais ou até mesmo de áreas urbanas para abastecimento dos solos.
“Muitas vezes, a imprensa ou setores da nossa sociedade tratam os produtores de alimentos, especialmente os Irrigantes, como vilões, e nem sequer percebem que são eles verdadeiros heróis. Sujeitos às oscilações e humores do tempo, garantem a segurança alimentar. É no campo que se armazena a água para todos, pois a água infiltrada vai recarregar o lençol freático e garantir a saída da água em uma nascente que vai proporcionar condições para ser captada em um poço, represa ou direto no córrego, rio e, assim, ser a fonte de vida para a população. Com os cultivos de alta produtividade das áreas irrigadas o ano todo, é maior a captura do gás carbônico e a sua troca por oxigênio. Os produtores intensificam o processo de "limpeza" do ar nas cidades, garantindo uma melhor qualidade do ar e ao mesmo tempo dando regularidade ao ciclo hidrológico, pois a água utilizada para a irrigação, volta para a atmosfera pela evapotranspiração das culturas e nada se perde, apenas move-se de um lugar para outro e voltando ao solo pelas chuvas”, detalha.
Alfonso Sleutjes, presidente da Federação Brasileira de Plantio Direto e Irrigação (FEBRAPDP), reforça outros desafios encontrados com as restrições das leis ambientais e os problemas de fornecimento de energia elétrica.
“Dos pontos para alavancar a irrigação, o gargalo mais importante creio que seja o da licença ambiental para construção de barramentos. Hoje, é quase impossível conseguir uma licença ambiental para construir um barramento novo, onde tem que fazer supressão de mata, de árvore nativa ou de uma área de APP. E um dos pontos que poderia facilitar isso é tornar os barramentos de uso privado, em utilidade pública e interesse social para facilitar o processo de licenciamento. Outro ponto é a questão da energia elétrica. Temos uma energia elétrica de baixa qualidade com baixa disponibilidade, não só em regiões como Mato Grosso e Goiás, como dentro dos polos de irrigação, onde existem problemas de fornecimento de energia. E no período de maior demanda energética há muita oscilação de tensão, com queima de equipamentos”, revela Sleutjes.
Maurício Swart, presidente da Associação do Sudoeste Paulista de Irrigação e Plantio na Palha (ASPIPP), que atua em 12 municípios com mais de 40 mil hectares de cultivos irrigados, compartilha a experiência transformadora vivida na região.
“A irrigação transformou o Sudoeste Paulista, antes conhecido como ramal da fome, em polo de produção agrícola sustentável de alta tecnologia. São mais de 30 anos de instalação dos primeiros pivôs centrais, onde hoje se encontra altas diversidades de culturas bem rotacionadas, ao lado de inúmeros reservatórios de água que estão cercados por matas nativas com fauna e flora abundantes. E para ampliar a área irrigada no Brasil precisamos ampliar os investimentos em reservatórios de água desburocratizando as outorgas dágua e de construção de barramentos, precisamos investir mais em capacidade energética, capacitação e treinamento dos produtores para o ingresso na agricultura irrigada.”
Finalmente, em relação às pesquisas na área da irrigação, os esforços estão comprometidos com a eficiência do uso da água. Segundo Fernando Tangerino, a Unesp tem observado as culturas da cana, citros, feijão e milho. E os trabalhos abrangem a caracterização das áreas irrigadas, disponibilidade de água, monitoramento climático da região e determinação de coeficientes e indicadores que permitem precisão no manejo da irrigação.
“Aqui, no Noroeste Paulista, com as maiores taxas de evapotranspiração do Estado de São Paulo e com oito meses de déficit hídrico anual, a agropecuária de alto nível somente vai se concretizar se alicerçada em sistemas de irrigação. Então, parte do nosso trabalho envolve convencimento para que haja efetiva expansão da agropecuária irrigada”, conclui o pesquisador.
Evento
Em sua primeira edição, a FIIB - Feira Internacional da Irrigação 2017, acontece até esta quinta-feira, dia 3 de agosto, na Av. Guilherme Campos, 500, Jardim Santa Genebra, Campinas/SP. O evento conta com o apoio e a participação de empresas públicas e privadas do setor.
Federação Brasileira de Plantio Direto e Irrigação (FEBRAPDP), 02 de Agosto de 2017.
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