AGRICULTURA IRRIGADA E ATUAÇÃO
DA UNESP NO OESTE PAULISTA
 
 

Fernando Braz Tangerino Hernandez
UNESP - Ilha Solteira

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1. ANTECEDENTES
A história da
Área de Hidráulica e Irrigação da FEIS-UNESP pode ser dividida em duas fases. A primeira fase começa e se confunde com a criação e instalação da FEIS-UNESP, onde Francisco Cassiano foi o pioneiro, tendo projetado e instalado os primeiros sistemas de irrigação da Fazenda de Ensino e Pesquisa - Cerrado. Ao seu lado tinha José Antônio Frizzone e José Renato Zanini. Estes profissionais iniciaram os trabalhos de pesquisa em agricultura irrigada na região.
A segunda fase da história da Área de Hidráulica e Irrigação começa a partir da transferência de José Antônio Frizzone (fevereiro/88) para a ESALQ-USP e logo em seguida de José Renato Zanini (março/89) para a FCAVJ-UNESP.Após estas transferências foi contratado (junho/1989)
Fernando Braz Tangerino Hernandez que inicialmente assumiu as disciplinas de Irrigação e Drenagem e Hidráulica Agrícola. Alguns meses depois, João Luís Zocoler assume a disciplina de Hidráulica Agrícola, sendo esta a situação atual: Fernando Braz Tangerino Hernandez como Professor Responsável por Irrigação e Drenagem e colaborador em Hidráulica Agrícola e João Luís Zocoler Professor Responsável por Hidráulica Agrícola e colaborador em Irrigação e Drenagem.
Neste novo contexto, a Área de Hidráulica definiu dois campos de trabalho, sendo um voltado para grandes propriedades e outro voltado para pequenas áreas ou pequenos produtores. Para grandes áreas a preocupação é melhorar as condições atuais de cultivo, enquanto que para as pequenas propriedades a preocupação é dupla, melhorar as condições de trabalho e introduzir culturas alternativas que objetivam a diversificação agrícola regional.
Ainda em 1989 é instalada pesquisa que visa verificar a viabilidade da cultura da figueira (
Ficus carica L.) na região, bem como quantificar efeitos de lâminas de irrigação e doses de nitrogênio na cultura.
Esta cultura foi pesquisada pela Área de Hidráulica e Irrigação até 1993, possibilitando a publicação de inúmeros trabalhos científicos e artigos de divulgação. As pesquisas foram financiadas pelo CNPq e FAPESP, tendo também como fato marcante, a concessão pela FAPESP da primeira Bolsa de Iniciação Científica do Curso de Agronomia da FEIS-UNESP.
As pesquisas mostraram a viabilidade da cultura da figueira na região sob condições de irrigação suplementar. Com o suprimento hídrico garantido, uma nova fase de pesquisas se iniciou em outra área, a Fruticultura, visando encontrar a melhor época de poda, de modo a oferecer a maior produtividade e também a melhor receita líquida, uma vez que a oferta e o preço da fruta sofre um grande efeito da sazonalidade.
Em 1990 Fernando Braz Tangerino Hernandez defende sua Dissertação de Mestrado junto à FCAVJ-UNESP com o título de "Determinação do consumo de água na cultura do trigo (
Triticum aestivum L.) na região de Jaboticabal - SP" e no ano seguinte inicia seu Curso de Doutorado na ESALQ-USP, vindo a defender sua tese intitulada "Efeitos da supressão hídrica sobre os aspectos produtivos e qualitativos da cultura do melão", em 1995.
Em 1991 João Luís Zocoler inicia seu Curso de Mestrado na ESALQ-USP, onde defende a Dissertação intitulada "Custos da irrigação por aspersão convencional em função da pressão de operação, diâmetros dos bocais e espaçamento dos aspersores", em 1994. Em 1995 inicia seu Curso de Doutorado também na ESALQ-USP, onde defende em 1998 a Tese "Modelo para dimensionamento econômico de sistemas de recalque em projetos hidroagrícolas".
Com o êxito das pesquisas com a cultura da figueira, uma nova cultura visando dar opção de plantio aos pequenos produtores precisava ser pesquisada pela Área de Hidráulica e Irrigação. Esta cultura foi a do melão. O projeto "Desenvolvimento de tecnologias para a cultura do melão (
Cucumis melo L.) na região de Ilha Solteira - SP" contou com o apoio financeiro do CNPq e FAPESP e se iniciou em 1990, tendo uma parte de campo finalizada em 1995.
Este projeto possibilitou a obtenção de resultados bastantes interessantes, mas principalmente mostrou a viabilidade do cultivo da cultura sem riscos ambientais em pelo menos seis meses do ano na região.
Sempre buscando alternativas ao pequeno produtor, a introdução da cultura da pupunha (
Bactris gasipaes HBK) na região e o conseqüente início das pesquisas se deu em 1994. Este projeto visa avaliar o comportamento da cultura na região e a quantificação das necessidade hídricas da cultura que traduzem a maior produção de palmitos tem o apoio financeiro da FAPESP e do PRODETAB e possibilita o trabalho conjunto com pesquisadores da EMBRAPA e do INPA.
O ano de 1997 marcou o início das pesquisas em videiras, estando a Área de Hidráulica e Irrigação desenvolvendo pesquisas atualmente nas cidades de Marinópolis, Irapuru, Junqueirópolis, além da cidade sede, Ilha Solteira.
Dessa maneira, as culturas que merecem atenção das pesquisas da Área de Hidráulica e Irrigação são uva, pupunha, melão, figo, milho, feijão e soja.
As linhas de pesquisas desenvolvidas são: Subsídios à projetos de irrigação, Consumo de água pelas culturas, Manejo da irrigação das culturas, Custos e análise econômica da irrigação, Fertirrigação e Hidráulica de Sistemas.
Para o desenvolvimento dos trabalhos, Fernando Braz Tangerino Hernandez e João Luís Zocoler contam a colaboração de alunos de graduação e de mestrado (Bolsistas da FAPESP e CNPq) e Técnicos Agrícolas. Para a divulgação dos trabalhos, os envolvidos nos trabalhos participam de diferentes Congressos, Simpósios, realizam palestras, editam Boletins Técnicos, publicam em Revistas especializadas, escrevem para jornais e mais recentemente a Internet tem sido utilizada para a divulgação e disponibilização dos conhecimentos disponíveis. A consulta é pública e pode ser feita no "site"
http://www.agr.feis.unesp.br/IRRIGACAO.html. Por exemplo, a versão eletrônica deste Anais, com fotos e entrevistas pode ser vista em http://www.agr.feis.unesp.br/jales.htm que é uma ramificação do site (URL) anterior.
 

2. A REGIÃO E A SITUAÇÃO ATUAL
A região noroeste do estado de São Paulo, chamada de Região dos Grandes Lagos apresenta duas realidades distintas. Considerando a EDR - Jales tem-se o predomínio de pequenas propriedades onde o modelo agrícola a ser adotado é o da fruticultura obrigatoriamente, pois possibilita maiores retornos financeiros por unidade de área.
Já a EDR - Andradina apresenta um módulo agrícola baseado na pecuária extensiva e grandes propriedades agrícolas. Nesta região a área irrigada tem crescido em função das instalações dos sistemas de irrigação tipo pivô central, que têm função de produzir milho para silagem para suprimento dos confinamentos. Produzem também soja no período das águas.
O Quadro 1 resume as informações coletadas em 1995/96 pela Secretaria de Agricultura através do LUPA nas EDR's da região. Informações complementares estão disponíveis na URL
http://www.cati.sp.gov.br. Da mesma forma, o Quadro 2 traz as principais culturas por área cultiva das EDR's da região.
Neste cenário agrícola, em que a irrigação, tanto ao nível de pequenos, como de grandes proprietários, é feita de modo empírico, inclusive com a constatação de projetos mal dimensionados e em outros casos, é possível encontrar irrigantes que possuem sistemas que não passaram pelo crivo de nenhum profissional da área (sem projetos), a UNESP vem tentando a aproximação de modo a estimular e transferir informações que possam contribuir para a modernização da agricultura regional. Esta é feita através de parcerias com o produtor e também através de cursos, palestras e dias de campo.
 
 

QUADRO 1 - Algumas características dos sistemas de irrigação implantados e módulo rural das EDR's da região.

  Jales Andradina Dracena Fernandópolis

Votuporanga

Pivô Central 5 16 13 6 18
Localizada 285 42 92 70 14
Autopropelido 12 11 15 8 30
Convencional 721 322 255 94 156
UPA's 8.304 5.542 8.664 4.105 4.728
Hectares 311.733 71.6431,7 452.041 289.197 372.612,2
Média (ha) 37,5 129,3 52,2 70,5 78,8
% irrigada 12,3 7,1 4,3 4,3 4,6

 

QUADRO 2 - Área cultivada das principais culturas das EDR's da região noroeste do Estado de São Paulo. Dados em hectares.

Jales

Andradina

Dracena

Fernandópolis

Votuporanga

Laranja

13486,9

Abacaxi

3762,7

Manga

899

Laranja

12529,1

Laranja

13669,6

Limão

2377,5

Laranja

2466,8

Maracujá

669,1

Banana

1477,1

Manga

914,4

Banana

1717,3

Manga

2186,7

Laranja

491,6

Limão

723,6

Banana

101,1

Manga

1596,5

Limão

769,6

Amora

416

Melancia

217,8

Limão

58

Uva

1015,8

Goiaba

648,2

Uva

314,8

Tangerina

205,1

   

 

3. CONSUMO DE ÁGUA PELAS PLANTAS E CUSTOS DA IRRIGAÇÃO
Para o seu desenvolvimento as plantas necessitam de solo, água e fatores climáticos, tais como o ar, luz, temperatura, etc. Estes fatores influenciam diretamente o crescimento das plantas e suas produtividades.
Em função da fase fenológica da cultura e do clima, uma planta pode consumir mais ou menos água. Este consumo, ou seja, a retirada da água do solo se dá por dois modos, a transpiração das folhas das plantas e a evaporação da superfície do solo. À combinação destes dois fatores chamamos de evapotranspiração. A evapotranspiração da cultura é a quantidade de água que devemos repor às plantas para que elas expressem o seu máximo vigor e produtividade.
A Região dos Grandes Lagos é a região que apresenta a maior evapotranspiração do Estado de São Paulo, o evidencia um elevado consumo de água pelas plantas para que elas possam crescer e produzir.
Há duas maneiras de estimar qual a necessidade de água das plantas. A primeira delas é utilizando parâmetros climáticos para estimar a evapotranspiração. O método mais preciso é o de Penman, porém exige uma grande quantidade de sensores, que têm elevado custo. A maneira mais simples é através do método do Tanque Classe A, que é um tanque com água e a evaporação deste permite chegarmos à evapotranspiração.
Outra maneira de estimar as necessidades de água das culturas é através do monitoramento da água presente no solo. Para tanto o método mais simples é o do tensiômetro, um simples aparelho que permite identificar o momento de se iniciar as irrigações e também a quantidade de água a ser aplicada durante a irrigação das culturas.
Em relação aos sistemas de irrigação, grandes áreas têm na irrigação por pivô central o menor custo por hectare irrigado. Porém, por irrigar grandes áreas, o investimento inicial é alto.
Pequenas áreas e especialmente as de fruticultura devem procuram fazer suas irrigações por sistemas de irrigação localizada, que são os microaspersores e o gotejamento. Estes sistemas de irrigação permitem suprir as exigências de água das culturas à um custo operacional bastante baixo, se comparado com a aspersão convencional. Se bem dimensionados permitem irrigações com altos índices de uniformidade e também pode-se economizar fazendo a fertirrigação, ou seja, aplicando os fertilizantes junto com a água de irrigação. Estes sistemas também permitem a automação total da irrigação e economizam água e energia, pois exigem motores de menor potência.
 

4. DESENVOLVIMENTO REGIONAL
O desenvolvimento de uma região se dará de forma mais rápida e à um custo mais barato, se baseado na agricultura. E se esta agricultura for baseada na irrigação este processo será ainda melhor, pois a irrigação além de ser um seguro contra as secas (estabilidade de produção), melhora a qualidade dos produtos, permite colheitas fora da época normal, maiores produtividades, otimiza os custos de produção e finalmente permite alcançar maiores lucros.
Um exemplo desta situação é a cidade de Barreiras na Bahia, onde a receita da Prefeitura em 1992 era de R$ 160.000,00 por mês. Em 1996 alcançava a marca de R$ 2,0 milhões por mês. Isto tudo devido ao incremento da irrigação das terras do município.
O desenvolvimento sócio-econômico de uma região é acelerado quando alicerçado na agricultura porque a matriz insumo-produto da agricultura ou de setores agrícolas é mais longa. Veja por exemplo estes dados do BNDES. A partir de R$ 1,0 milhão na demanda final são gerados 355 empregos no setor de artigos de vestuário, 312 na agropecuária e 307 no setor de madeira e mobiliário. Em setores em que a dependência da agricultura é baixa ou nenhuma, tais como construção civil, transporte, siderurgia, automóveis e químicos diversos são gerados 180, 157, 151, 150 e 141 empregos, respectivamente.
Dessa maneira, o estímulo ao desenvolvimento da agricultura e de pequenas agroindústrias deve ser preocupação constante dos administradores públicos, pois sem estes segmentos fortalecidos, fica difícil também o fortalecimento das economias do setor urbano.
As culturas da uva, coco, figo e pupunha, somente como exemplos, permitem uma quantidade grande de alternativas pós-colheita que ainda não estão sendo exploradas. O uso da irrigação seguramente potencializa toda a economia regional. Atualmente ninguém cultiva uva sem a irrigação, da mesma maneira, pupunheiras cultivadas para a exploração do palmito podem produzir apenas 700 kg por hectare sem irrigação, enquanto que se irrigada, tem sido constatadas produtividades da ordem de 2.600 kg por hectare por ano, com potencial para 3.000-3.200 kg por hectare.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Da mesma maneira em que se tem a irrigação como meio de potencializar o desenvolvimento regional, os desafios tecnológicos de quem faz agricultura irrigada são cada vez maiores. Os custos dos insumos têm subido em índices superiores aos preços pagos à produção. A solução para esta situação é obter cada vez mais produtividades à custos de produção menores. É a eficiência produtiva chegando ao campo. Nos dias de hoje, não basta saber produzir, é necessário saber custos, conhecer mecanismos de conter desperdícios e também ter conhecimento de técnicas de conservação pós-colheita. Isto para muitos produtores é um verdadeiro desafio e não é fácil de ser encarado.
Da mesma maneira, a natureza nos impõe algumas restrições, que necessitam de conhecimentos técnicos cada vez mais aprimorados. Um exemplo é a qualidade da água usada para irrigação, que sofre restrição por contaminação de microorganismos e recente, tem sido constatado problemas de ferro e manganês em alguns mananciais. O problema tende a ser potencializado com o tempo.
Para que tenhamos todos uma sociedade cada vez mais justa, há de se unir os diferentes segmentos, seja público ou privado e em diferentes instâncias. Sem a união de esforços e cada um fazendo a sua parte, fica difícil vencer os desafios cada vez mais difíceis que o dia-a-dia nos impõe.