O número
de empresas virtuais no Brasil encolheu, mas a "nova economia"
brasileira está mais saudável. Hoje, um número
menor de concorrentes disputa um mercado que cresceu de forma sustentada
em 2001: o volume de vendas online quase triplicou. Os investimentos
de capital de risco, que somaram US$ 1,4 bilhão em 2000, caíram,
mas chegaram a US$ 800 milhões.
Apenas parte do dinheiro foi investida em empresas de tecnologia.
Os investidores, assustados com as perdas no mercado norte-americano,
onde mais de 500 empresas virtuais faliram no ano passado, ficaram
mais seletivos e cautelosos. "Se antes os fundos analisavam dez
projetos para escolher um, hoje a regra é analisar cem e, muitas
vezes, não investir", diz Mário Fleck, presidente
da Accenture
Brasil.
A estimativa de investimentos de capital de risco em 2001 é
de Robert Binder, da ABCR (Associação
Brasileira de Capital de Risco). Ele avalia que os investimentos ficaram
em US$ 800 milhões no ano
passado. É dinheiro investido em vários setores. Mas
a preferência dos investidores é sempre por negócios
com perspectivas de crescimento rápido e boa lucratividade.
Ou seja, empresas ligadas a novas tecnologias como aplicativos para
internet, biotecnologia, etc.
Sem
especulação
"De maneira geral, não houve grande especulação
no Brasil. Principalmente porque tivemos a oportunidade de observar
o que acontecia no mercado norte-americano", diz Binder.
Ele lembra, no entanto, que muitos investidores perderam dinheiro
por aqui. Desapareceram provedores, como o Super11.net, varejistas,
como o Fera.com e o Superofertas e sites especializados, como o Guialocal.
"O estouro não apareceu muito porque algumas empresas
foram absorvidas, outras desapareceram silenciosamente", afirma
André Castellini, consultor da Bain & Company.
O estouro da pequena bolha especulativa no Brasil, a exemplo do que
acontece nos EUA, não significa o fim dos negócios de
internet. "É óbvio que existiu uma bolha. Mas por
trás dessa bolha havia uma onda de inovações.
O que acabou foi a bolha especulativa, mas a onda continua",
diz Fleck.
Para quem sobreviveu, o resultado do ajuste é positivo. Primeiro
porque com um número menor de empresas, cada uma pode ficar
com um pedaço maior do mercado. Segundo, porque o mercado de
internet continua crescendo a taxas estratosféricas. Terceiro
porque, com o fim da especulação, acaba o dinheiro fácil,
e as empresas que tendem a surgir são mais viáveis e
sólidas.
"As empresas gastaram menos e cresceram mais em 2001, o que é
um sinal de amadurecimento", diz Paula Fonseca, que dirige a
Invent, uma incubadora que cria e desenvolve novos negócios.
Ela lembra que, em época de dinheiro fácil, muitas empresas
gastaram excessivamente com ublicidade. "Eram gastos irracionais.
Isso não existe mais."
Em 2001, o varejo online no Brasil movimentou US$ 906 milhões,
quase o triplo dos US$ 335 milhões do ano anterior. A estimativa
é do Boston Consulting Group e da Visa, que em novembro do
ano passado divulgaram estudo sobre as tendências do comércio
eletrônico na América Latina.
O mesmo estudo avalia que, mesmo que as economias da região
não cresçam em 2002, as empresas virtuais podem se expandir.
Motivo: o varejo virtual representa apenas 1% do varejo total e há,
portanto, espaço para aumentar essa participação.
Seleção
natural
Murillo Tavares, presidente do Submarino, chama o saneamento pelo
qual passou o mercado de "darwinismo quase cruel". Mas,
diz o executivo, depois da seleção natural pela qual
passaram as empresas, "acabaram as distorções".
A empresa dirigida por Tavares foi uma das sobreviventes. Fecha o
ano vendendo o triplo do que
vendia em 2000. O site faturou R$ 76 milhões, vendendo de livros
e CDs a perfumes e ferramentas.
Apesar de ter visto seus principais concorrentes virtuais irem à
bancarrota, o Submarino continua enfrentando competidores. Agora,
os oponentes são os varejistas tradicionais, como a livraria
Saraiva, Lojas Americanas e Ponto Frio, que também abriram
suas lojas virtuais.
Concentração
O saneamento do mercado de internet acabou por revelar também
que a nova economia não é tão diferente do mundo
que seus entusiastas chamavam de "velha economia": de maneira
similar ao que ocorre em muitos setores tradicionais, no mundo online,
um número pequeno de empresas domina o mercado.
No Brasil, os três maiores sites de varejo online de cada setor
abocanham cerca de 70% do mercado, revela a pesquisa do Boston Consulting
e da Visa.
Ou seja, com algumas exceções, mais nos EUA do que no
Brasil, quem acabará ganhando muito dinheiro com as novas tecnologias
são as grandes empresas e fundos já estabelecidos.
O relatório do Boston Consulting mostra que a concorrência
tende a se acirrar. O motivo: mesmo as
empresas tradicionais que já estão na rede ainda não
"aprenderam" qual a melhor maneira de usá-la em seus
negócios. O razoável é que invistam cada vez
mais para tirar proveito da internet.
Incubadoras de nova tecnologia
avançam 11%
A euforia
com as empresas de internet ajudou a consolidar no Brasil a atividade
dos fundos de
investimento em capital de risco e das incubadoras de novas empresas.
Em 2000, o número de incubadoras funcionando no Brasil saltou
35% e, no ano passado, cresceu outros 11%. Os investimentos de capital
de risco alcançaram US$ 1,4 bilhão em 2000.
Os investidores de risco investem em novas empresas em troca de uma
participação acionária. Eles procuram por boas
oportunidades, esperam que as empresas cresçam e que possam
vender suas ações e realizarem lucros.
"Para um país com as nossas taxas de juros, é uma
forma de financiamento muito boa", diz Robert Binder, diretor-executivo
da ABCR (Associação Brasileira de Capital de Risco).
As incubadoras concedem espaço físico, auxílio
técnico, apoio institucional e algumas vezes financeiro para
que jovens empresários com boas idéias de negócios
as coloquem em prática. Segundo a Anprotec
(Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos
de Tecnologias Avançadas), o Brasil, que contava com 69 incubadoras
em 1996, tem hoje mais de 150 unidades funcionando.
Tanto os fundos quanto as incubadoras são instrumentos importantes
para financiar a criação de novos negócios e,
indiretamente, o crescimento econômico. O grande interesse que
os negócios de Internet despertou nos investidores acabou ajudando
a consolidar sua atuação no Brasil.
"Tivemos vários obstáculos. Primeiro a inflação,
depois a instabilidade econômica e os planos todos pelos quais
passamos. A estabilidade ajudou o setor a se organizar. O boom de
Internet acabou contribuindo de forma significativa para o crescimento
e a consolidação", diz Binder.
O diretor da ABCR lembra, no entanto, que existem problemas que tanto
incubadoras quanto os investidores de capitais enfrentam no Brasil
e que podem prejudicar o crescimento no setor.
Ele aponta a falta de um mercado de capitais desenvolvido. Os investidores
esperam poder vender sua
participação nas empresas para realizar lucro, e a Bolsa
seria o caminho ideal. O problema: a falta de liquidez da Bolsa.
Com volumes pequenos de negócios, a Bolsa brasileira acaba
não sendo uma opção viável. "O que
atrapalha na hora de tentar abrir o capital das empresas, diz Binder.
* Ver também Associação
Brasileira de Captadores de Recursos
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