Internet ganha mais com menos empresas

Volume de vendas online triplica em 2001, mas cai número de concorrentes; 3 sites controlam 70% do varejo

Marcelo Billi

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O número de empresas virtuais no Brasil encolheu, mas a "nova economia" brasileira está mais saudável. Hoje, um número menor de concorrentes disputa um mercado que cresceu de forma sustentada em 2001: o volume de vendas online quase triplicou. Os investimentos de capital de risco, que somaram US$ 1,4 bilhão em 2000, caíram, mas chegaram a US$ 800 milhões.
Apenas parte do dinheiro foi investida em empresas de tecnologia. Os investidores, assustados com as perdas no mercado norte-americano, onde mais de 500 empresas virtuais faliram no ano passado, ficaram mais seletivos e cautelosos. "Se antes os fundos analisavam dez projetos para escolher um, hoje a regra é analisar cem e, muitas vezes, não investir", diz Mário Fleck, presidente da
Accenture Brasil.
A estimativa de investimentos de capital de risco em 2001 é de Robert Binder, da ABCR (Associação
Brasileira de Capital de Risco). Ele avalia que os investimentos ficaram em US$ 800 milhões no ano
passado. É dinheiro investido em vários setores. Mas a preferência dos investidores é sempre por negócios com perspectivas de crescimento rápido e boa lucratividade. Ou seja, empresas ligadas a novas tecnologias como aplicativos para internet, biotecnologia, etc.

Sem especulação
"De maneira geral, não houve grande especulação no Brasil. Principalmente porque tivemos a oportunidade de observar o que acontecia no mercado norte-americano", diz Binder.
Ele lembra, no entanto, que muitos investidores perderam dinheiro por aqui. Desapareceram provedores, como o Super11.net, varejistas, como o Fera.com e o Superofertas e sites especializados, como o Guialocal. "O estouro não apareceu muito porque algumas empresas foram absorvidas, outras desapareceram silenciosamente", afirma André Castellini, consultor da Bain & Company.
O estouro da pequena bolha especulativa no Brasil, a exemplo do que acontece nos EUA, não significa o fim dos negócios de internet. "É óbvio que existiu uma bolha. Mas por trás dessa bolha havia uma onda de inovações. O que acabou foi a bolha especulativa, mas a onda continua", diz Fleck.
Para quem sobreviveu, o resultado do ajuste é positivo. Primeiro porque com um número menor de empresas, cada uma pode ficar com um pedaço maior do mercado. Segundo, porque o mercado de internet continua crescendo a taxas estratosféricas. Terceiro porque, com o fim da especulação, acaba o dinheiro fácil, e as empresas que tendem a surgir são mais viáveis e sólidas.
"As empresas gastaram menos e cresceram mais em 2001, o que é um sinal de amadurecimento", diz Paula Fonseca, que dirige a Invent, uma incubadora que cria e desenvolve novos negócios.
Ela lembra que, em época de dinheiro fácil, muitas empresas gastaram excessivamente com ublicidade. "Eram gastos irracionais. Isso não existe mais."
Em 2001, o varejo online no Brasil movimentou US$ 906 milhões, quase o triplo dos US$ 335 milhões do ano anterior. A estimativa é do Boston Consulting Group e da Visa, que em novembro do ano passado divulgaram estudo sobre as tendências do comércio eletrônico na América Latina.
O mesmo estudo avalia que, mesmo que as economias da região não cresçam em 2002, as empresas virtuais podem se expandir. Motivo: o varejo virtual representa apenas 1% do varejo total e há, portanto, espaço para aumentar essa participação.

Seleção natural
Murillo Tavares, presidente do Submarino, chama o saneamento pelo qual passou o mercado de "darwinismo quase cruel". Mas, diz o executivo, depois da seleção natural pela qual passaram as empresas, "acabaram as distorções".
A empresa dirigida por Tavares foi uma das sobreviventes. Fecha o ano vendendo o triplo do que
vendia em 2000. O site faturou R$ 76 milhões, vendendo de livros e CDs a perfumes e ferramentas.
Apesar de ter visto seus principais concorrentes virtuais irem à bancarrota, o Submarino continua enfrentando competidores. Agora, os oponentes são os varejistas tradicionais, como a livraria Saraiva, Lojas Americanas e Ponto Frio, que também abriram suas lojas virtuais.

Concentração
O saneamento do mercado de internet acabou por revelar também que a nova economia não é tão diferente do mundo que seus entusiastas chamavam de "velha economia": de maneira similar ao que ocorre em muitos setores tradicionais, no mundo online, um número pequeno de empresas domina o mercado.
No Brasil, os três maiores sites de varejo online de cada setor abocanham cerca de 70% do mercado, revela a pesquisa do Boston Consulting e da Visa.
Ou seja, com algumas exceções, mais nos EUA do que no Brasil, quem acabará ganhando muito dinheiro com as novas tecnologias são as grandes empresas e fundos já estabelecidos.
O relatório do Boston Consulting mostra que a concorrência tende a se acirrar. O motivo: mesmo as
empresas tradicionais que já estão na rede ainda não "aprenderam" qual a melhor maneira de usá-la em seus negócios. O razoável é que invistam cada vez mais para tirar proveito da internet.

Incubadoras de nova tecnologia avançam 11%

A euforia com as empresas de internet ajudou a consolidar no Brasil a atividade dos fundos de
investimento em capital de risco e das incubadoras de novas empresas. Em 2000, o número de incubadoras funcionando no Brasil saltou 35% e, no ano passado, cresceu outros 11%. Os investimentos de capital de risco alcançaram US$ 1,4 bilhão em 2000.
Os investidores de risco investem em novas empresas em troca de uma participação acionária. Eles procuram por boas oportunidades, esperam que as empresas cresçam e que possam vender suas ações e realizarem lucros.
"Para um país com as nossas taxas de juros, é uma forma de financiamento muito boa", diz Robert Binder, diretor-executivo da ABCR (Associação Brasileira de Capital de Risco).
As incubadoras concedem espaço físico, auxílio técnico, apoio institucional e algumas vezes financeiro para que jovens empresários com boas idéias de negócios as coloquem em prática. Segundo a
Anprotec (Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos de Tecnologias Avançadas), o Brasil, que contava com 69 incubadoras em 1996, tem hoje mais de 150 unidades funcionando.
Tanto os fundos quanto as incubadoras são instrumentos importantes para financiar a criação de novos negócios e, indiretamente, o crescimento econômico. O grande interesse que os negócios de Internet despertou nos investidores acabou ajudando a consolidar sua atuação no Brasil.
"Tivemos vários obstáculos. Primeiro a inflação, depois a instabilidade econômica e os planos todos pelos quais passamos. A estabilidade ajudou o setor a se organizar. O boom de Internet acabou contribuindo de forma significativa para o crescimento e a consolidação", diz Binder.
O diretor da ABCR lembra, no entanto, que existem problemas que tanto incubadoras quanto os investidores de capitais enfrentam no Brasil e que podem prejudicar o crescimento no setor.
Ele aponta a falta de um mercado de capitais desenvolvido. Os investidores esperam poder vender sua
participação nas empresas para realizar lucro, e a Bolsa seria o caminho ideal. O problema: a falta de liquidez da Bolsa.
Com volumes pequenos de negócios, a Bolsa brasileira acaba não sendo uma opção viável. "O que atrapalha na hora de tentar abrir o capital das empresas, diz Binder.


* Ver também
Associação Brasileira de Captadores de Recursos
 

 Folha de São Paulo, 01 de janeiro de 2002, p. B1.



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