Um
dos grandes dilemas a atormentar as famílias de classe média
é sobre a formação a dar aos filhos. Minha geração
assistiu à revolução de Woodstock, nos costumes,
e de Summerhill na educação. A famosa escola libertária
inglesa era a esperança de superação dos velhos
modelos ortodoxos de educação, embotadores da criatividade
e da iniciativa.
A geração Summerhill dançou. Em plena era da internet,
do trabalho em rede, da liberdade de criação, os modelos
de escolas libertárias aparentemente entram em declínio.
O que ocorre?
Primeiro, é importante salientar as novas características
do mercado de trabalho. As modernas formas de gestão estimulam
o empreendedorismo até entre funcionários de empresas,
o trabalho horizontal, que depende da capacidade de interação
dos diversos segmentos, a criatividade, mas amarrada à visão
estratégica da empresa. No plano individual, haverá expansão
crescente do trabalho em rede. Ambos os movimentos -nas empresas e na
rede- demandam estágios avançados de relacionamento social.
As escolas libertárias criam redomas fantásticas, nas
quais as crianças podem desenvolver suas aptidões e opiniões
livremente, sem as limitações do pensamento burocrático,
da visão autoritária, do empacotamento do conteúdo
em 60 minutos de aula. Só que aquele mundo de aquário
não existe na vida real. O choque com a realidade criou legiões
de pessoas meramente malcriadas, indisciplinadas ou gravemente desajustadas
social e profissionalmente.
Por outro lado, a escola convencional está longe de abarcar todas
as formas de conhecimento que surgiram no rastro da internet.
A criançada que está entrando na escola hoje será
a primeira legítima representante da geração "Alt
Tab", o pessoal que não aceitará o pensamento linear,
monofásico que imperou especialmente nos anos 80 e 90.
Com o volume de informação disponível, com o raciocínio
se acostumando desde cedo a trabalhar com várias realidades simultâneas,
certamente haverá uma elite intelectual extraordinariamente mais
sofisticada, especializada em estruturar pensamentos e informações
no universo infinito de dados disponíveis.
Mais do que nunca haverá a necessidade da criatividade -que as
escolas libertárias estimulam-, mas amarrada a um pensamento
disciplinado.
Não apenas isso. Tome-se o exemplo de análise econômica.
Com os dados macroeconômicos, setoriais e regionais cada vez mais
disponíveis na internet, a educação a distância
será um elemento muito mais eficaz do que a educação
presencial. Pela internet, com as modernas ferramentas tecnológicas,
será possível pegar o pulso da economia em tempo real.
Só que, nessa fase de transição, os cursos à
distância na maioria das vezes limitam-se a empacotar o conteúdo
presencial.
Por outro lado, trabalhar com essa montanha de dados exigirá
não apenas criatividade, como disciplina. E esse ingrediente
-fundamental- as escolas libertárias não fornecem. Como
não fornecem outro elemento crucial no novo mundo que se desvenda:
a capacidade de relacionamento social. É só conferir a
quantidade de jovens talentosos, desenvolvedores de softwares e sistemas,
incapazes de cumprir um cronograma, que largam um trabalho no meio para
atender a uma proposta melhor.
Em estruturas não hierarquizadas, seja no trabalho em rede, seja
na gestão horizontal interdepartamental das empresas, a chave
é o relacionamento social civilizado. E isso demanda capacidade
de entender seu espaço de atuação, não invadir
a área do vizinho, saber conversar, negociar, compartilhar, valores
que estão longe de serem incutidos nos padrões pedagógicos
libertários.
Nos extremos têm-se as escolas convencionais com seus esquemas
de fabricação de songomongos, e as libertárias,
fabricando monstrinhos que não conhecem limites.
A educação do futuro terá que ser uma síntese
depurada desses extremos.
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