OS OPRIMIDOS DO SOFTWARE

 


A discussão sobre software livre (SL), por indefinida, tem sido bastante estimulante e elucidativa, demonstrando que existem muitos conceitos a serem aplainados. Vamos ao que escreve o leitor Milton Adrião, profissional do setor.
Em coluna recente se dizia que o SL consiste em um núcleo (desenvolvido por grupos pequenos e controlados) e a periferia (os componentes, que podem ser desenvolvidos por uma comunidade).
A questão que Milton coloca é que um dos pontos fortes do modelo de software livre é a capacidade de substituir componentes de uma solução sem provocar o colapso de todo o sistema. Para que isso seja possível, é preciso que os sistemas tenham sido desenvolvidos seguindo especificações -formais ou não-, um contrato a ser honrado por todos os desenvolvedores quando criarem suas soluções, explica ele. O respeito aos padrões é mais importante que o livre acesso ao código-fonte.
A questão é que toda vez que se impuseram padrões foi por pressão dos grandes compradores (em verdade, do governo norte-americano), que buscavam proteger seus investimentos, preservando a possibilidade de trocar de fornecedor caso determinado produto não atendesse às expectativas de performance, de robustez, de preço, de facilidade de uso ou quaisquer outras.
Quando existem padrões, tem sido farta a oferta de produtos, tanto pagos quanto livres, tanto abertos quanto fechados, diz. E isso tem acontecido muito mais com os softwares de comunicação -protocolos como FTP- do que com software que captam e manipulam dados.
Sem padrões, um usuário de um SL para edição de textos ou base de dados será tão dependente do sistema que usa quanto de um sistema pago (com a exceção não menosprezável de não precisar pagar pela algema).
Alguns SLs têm pego carona em software pago, provendo importação de dados -por exemplo, o OpenOffice. Mas o OpenOffice só pode ser bem-sucedido porque os formatos usados pela Microsoft são padrão de fato (ainda que não de direito). No entanto a Microsoft pode tentar "quebrar" seus concorrentes mudando os formatos de versão a versão, imputando aos demais os custos de seguir o líder.
A solução seria a existência de um padrão formal. Mas quem define?, pergunta ele. Como garantir a liberdade de ir e vir de um usuário, dando a ele plenas condições de, a qualquer momento que deseje, trocar de software sem precisar reescrever sua vida a cada troca?
A pergunta é, a resposta é complexa, pois haveria a necessidade de que os diferentes construtores de software concordassem sobre as características negociais dos dados que usam, isolando os condicionantes arquiteturais que determinam a formatação dos dados e provendo interfaces documentadas para a transferência (exportação e importação) de dados de um lugar a outro.
Essa questão é crucial para a consolidação do SL, cabe à comunidade resolvê-la, mas não tem sido a regra, diz. Alguns desenvolvedores de SL reproduzem o comportamento que criticam nos desenvolvedores de software proprietário. Repetindo Paulo Freire, o oprimido reproduz o opressor.

 



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