POPULAÇÃO ESGOTA ÁGUA DOCE, ALERTA A ONU

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Relatório anual dá destaque para pressão sobre recursos hídricos; mundo atingirá 9,3 bilhões de pessoas em 2050
 
Jeremy Lovell
 

A população mundial está esgotando os recursos do planeta num ritmo sem precedentes e insustentável, que precisa ser contido rapidamente para evitar um desastre global, em especial com a escassez de água. É o que diz um estudo das Nações Unidas que será divulgado hoje. "Mais pessoas estão usando mais recursos e com intensidade maior do que em qualquer outro momento da história humana", afirma a ONU no seu relatório anual de população para 2001.
"Os custos de postergar a ação vão subir rapidamente com o tempo", afirma o documento. "Em 2050, 4,2 bilhões de pessoas (mais de 45% do total mundial) estarão vivendo em países que não podem garantir a quota diária de 50 litros de água por pessoa para suas necessidades básicas", alerta o relatório.
A população mundial, que dobrou para 6,1 bilhões nos últimos 40 anos, deve saltar 50% - segundo a projeção - dentro de mais meio século, para 9,3 bilhões. Todo o crescimento se dará no mundo em desenvolvimento, cujas reservas já são super exploradas. O relatório afirma que a água está sendo usada e poluída a taxas catastróficas. No presente, 54% das reservas disponíveis de água doce são utilizadas a cada ano. Essa cifra deve subir para 70% em 2025, só com o crescimento populacional. Se o nível de consumo nos países em desenvolvimento alcançasse o do mundo desenvolvido, o uso saltaria para 90%.

Taxas insustentáveis

As taxas de uso da água já são insustentáveis em vários países. Em cidades da China, da América Latina e do sul da Ásia, o nível dos aqüíferos (águas subterrâneas) cai mais de um metro por ano. O relatório diz que 1,1 bilhão de pessoas já não tem acesso a água limpa. Nos países em desenvolvimento, até 95% dos esgotos e 70% dos rejeitos industriais são simplesmente despejados em cursos d'água, sem tratamento.
Florestas tropicais vitais estão sendo destruídas à mais alta taxa da história, levando com elas fontes cruciais de biodiversidade. Sua destruição contribui também para agravar o aquecimento global e, por meio do chamado efeito estufa, para elevar o nível dos mares, por sua simples dilatação (leia reportagem abaixo, à direita). Os oceanos e os recursos pesqueiros continuam a ser maciçamente super explorados. A erosão está destruindo muitas espécies vegetais -um quarto das quais poderá ter desaparecido por completo em 2025.

Alimentos, Aids e mulheres

A ONU diz que a produção de comida teria de dobrar e sua distribuição precisaria melhorar muito para alimentar a população. A maior parte desse aumento na produção viria de variedades de alto rendimento, cujo plantio demandaria ainda mais defensivos agrícolas prejudiciais para o ambiente.
O documento diz que a globalização do comércio aumentou a riqueza global, mas, ao mesmo tempo, ampliou as desigualdades. Com isso, hordas de pobres excluídos são forçadas a esgotar seus já escassos recursos naturais, para sua sobrevivência cotidiana. A epidemia global de Aids entrou numa espiral fora de controle, assinala o relatório. Muito pouco dinheiro está disponível para contê-la, assim como para amparar a conseqüente avalanche de órfãos e excluídos.
Para a ONU, uma chave para resolver tais problemas é dar às mulheres - que desempenham um papel fundamental, mas pouco reconhecido, nas comunidades rurais do mundo inteiro - uma participação maior na sociedade, além de, igualmente importante, na decisão sobre o tamanho desejado para suas famílias. "Fica claro que dar acesso total a serviços de saúde reprodutiva seria bem menos custoso, no longo prazo, do que as conseqüências ambientais do crescimento da população que virá, se as necessidades de saúde reprodutiva não forem satisfeitas", diz o relatório.

Folha de São Paulo, 07 de novembro de 2001, p.A16.



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