BRASIL TEM BASTANTE ÁGUA, MAS POUCO ESGOTO

UNESP Ilha Solteira - Área de Hidráulica e Irrigação

Folha de São Paulo

Enquanto 90% da população tem acesso à água, esgotamento sanitário só atende 75%; déficit se concentra nas áreas pobres

Governo federal admite deficiência, mas afirma que, entre 2003 e 2006, destinou investimentos de R$ 12,9 bi para setor de saneamento

O Brasil tem indicadores semelhantes ao de países com alto desenvolvimento humano no ranking que mostra a taxa da população com acesso à água potável -fica próximo da Coréia do Sul. No entanto, na coleta de esgoto, o país volta para patamares de desenvolvimento médio, atrás do Paraguai.

É o que aponta o Relatório de Desenvolvimento Humano 2006, divulgado pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Neste ano, o tema é "Além da escassez: poder, pobreza e a crise mundial da água". Os dados são referentes a 2004.

Enquanto 90% da população brasileira tem acesso à água, no acesso ao esgotamento adequado a taxa de atendimento é de 75%. Ambos evoluíram de 1990 a 2004, mas em ritmos diferentes: a cobertura cresceu, respectivamente, 8,4% e 5,6%.

Mesmo com o alto índice de atendimento da população com água potável, próximo de cumprir a Meta do Milênio (dentro dos Objetivos do Milênio), o Brasil aparece em 74º no ranking de 159 países porque outros têm desempenho melhor.

Em relação ao saneamento, o país está em 67º lugar entre 149 nações analisadas. O relatório aponta, porém, que parte significativa do déficit brasileiro nesse setor se refere à falta de atendimento aos mais pobres.

Contraste
"No Brasil, os 20% mais ricos desfrutam de níveis de acesso a água e saneamento comparáveis ao de países ricos. Enquanto isso, os 20% mais pobres têm cobertura tanto de água como de esgoto inferior à do Vietnã", afirma o estudo do Pnud.

O secretário de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, Abelardo de Oliveira Filho, reconhece que diferenças sociais e regionais são o desafio, mas diz que o governo tem adotado mecanismos para tentar reduzi-las. Afirma que o governo federal gasta hoje 0,3% do PIB com saneamento ao ano. De 2003 a 2006, segundo ele, foram disponibilizados R$ 12,9 bilhões para o setor.

Na última terça, o Conselho Curador do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) aprovou R$ 3 bilhões destinados ao saneamento em 2007.

O relatório também diz que o fato de o Brasil estar no topo da lista das maiores reservas hídricas (dispõe de 12% da água doce do planeta) não significa que tenha conseguido superar o desabastecimento: cita o "polígono da seca", região semi-árida de 940 mil km2 que abrange nove Estados do Nordeste e enfrenta um problema crônico de falta de água.
Por outro lado, o país está entre os mais citados no documento -ao lado de China e Etiópia-, ganhando espaço para um texto do presidente reeleito Luiz Inácio Lula da Silva. "Realço a necessidade de pôr a água e o saneamento no centro da agenda de desenvolvimento global, dentro de um plano de ação para ir ao encontro do Objetivo de Desenvolvimento do Milênio. Essa medida levaria a uma mobilização de recursos e a que as pessoas se centrem no desafio que todos nós temos de enfrentar", afirma Lula.

Nos casos de boas iniciativas para tentar atender os mais pobres com água potável e saneamento aparecem Porto Alegre e Brasília. Na capital gaúcha, o serviço de abastecimento (que atende 99,5% da população) é considerado "excelente" e uma "prova" de que uma empresa pública pode fornecer acesso universal a preço bom.

Já o sistema condominial de saneamento do Distrito Federal é citado como alternativa para levar o serviço à população pobre. Em vez de atender domicílios, o sistema presta serviço a quarteirões, e as obras são feitas em mutirão.

O documento fala de outras iniciativas brasileiras, como cisternas e o caso do Ceará, que, para solucionar impasse entre industriais e agricultores, elaborou um plano de gestão de consumo da água.

"Não queremos dizer que o serviço tem de ser público ou privado. Não importa o mecanismo de provisão. O que tem de existir é eqüidade, fazendo a água chegar aos mais pobres", diz Ricardo Fuentes, consultor do Pnud. (LUCIANA CONSTANTINO E ANTÔNIO GOIS)

 


UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA