Produtores
rurais de 13 municípios que margeiam o lago de Itaipu buscam,
na Justiça Federal, indenização por prejuízos
que afirmam terem sido provocados, nos últimos 20 anos, pelas
alterações microclimáticas com a formação
do lago da hidrelétrica.
A Itaipu contesta a ação e acusa advogados de criarem
uma " indústria de indenizações". Segundo
a ação proposta na Justiça Federal, as alterações
microclimáticas -decorrentes da criação do que
é considerado o maior lago artificial do mundo- provocaram prejuízos
a 1.300 produtores nos 13 municípios e atingem os 1.099 km de
entorno do perímetro brasileiro do lago, com 70 mil hectares
de terra. Com base em números levantados por produtores que movem
a ação contra a Itaipu Binacional, nos últimos
20 anos os prejuízos somariam R$ 20 mil por hectare. Uma simples
conta de multiplicação mostra o tamanho potencial da ação
indenizatória contra a binacional: R$ 1,4 bilhão.
O advogado César Augusto Gularte de Carvalho, 37, que dirige
o escritório Estúdio Legale, de Porto Alegre (RS), e representa
os 1.300 produtores no processo, afirma que é prematuro levantar
cifras. "Tudo depende do histórico de cada imóvel
e do tipo de exploração dele por seu proprietário",
afirma. Carvalho, no entanto, diz que os valores poderão passar
dos "dez dígitos". Para fundamentar a tese das alterações
microclimáticas, o escritório de Carvalho contratou uma
equipe de especialistas, que foi a campo analisar os efeitos da formação
do lago sobre a produção agropecuária nas propriedades.
O curioso é que o ponto de partida das investigações
foi um estudo contratado pela própria Itaipu Binacional ao Simepar
(Sistema Meteorológico do Paraná) e coordenado pela PUC
(Pontifícia Universidade Católica) do Paraná. "O
estudo de Itaipu, chamado Mesolite, foi em nível macrorregional.
Nossa investigação foi em nível micro, somente
na área em que o estudo apontava modificações na
umidade específica do ar e de temperatura, em uma faixa de 5
km em relação às margens do lago", afirma
Carvalho.
O que mudou no clima
As alterações climáticas anunciadas na ação
consistem na modificação dos regimes dos ventos e de níveis
de temperatura do ar, umidade, evaporação e radiação,
o que provocou elevação de temperatura e aquecimento do
solo, expondo as plantas a uma situação de estresse, com
déficit hídrico e redução da produtividade.
Em uma mesma propriedade, como a de Aldino Larssem, 68, em Itaipulândia,
a colheita de soja feita com acompanhamento técnico mostrou diferença
de produtividade de 40% entre áreas mais distantes do lago e
aquelas dentro da faixa de 5 km às margens. "Eu colhi 40%
menos na faixa do lago, mesmo utilizando as mesmas sementes, a mesma
tecnologia e adubação. E mais: tive custos maiores nas
proximidades da faixa de cortina verde plantada por Itaipu, já
que tive que pagar mão-de-obra manual para o controle da leucena",
afirmou Larssem, proprietário de 556 hectares.
A cortina verde citada por Larssem é outro motivo para os pedidos
de indenização. Na faixa de proteção do
lago contra a erosão, a binacional introduziu uma espécie
exótica chamada leucena, que virou invasora de lavouras.
Produtores dizem que o desconforto térmico praticamente inviabilizou
as atividades pecuárias. As empresas integradoras -que fornecem
filhotes e, depois, compram os animais adultos- de suínos e aves
quase não fazem contratos. Além dos pedidos de indenização,
os produtores reivindicam o ressarcimento pela desvalorização
das terras e até pelo fim da segurança. "Depois do
lago, foi como se Itaipu tivesse asfaltado o rio Paraná na altura
de Guaíra. Um trator é roubado e levado para o Paraguai,
em balsas, em menos de dez minutos", afirma o agrônomo Lincoln
Villi Gerke, 35.
OUTRO
LADO: Itaipu contesta mudança no clima
Em nota assinada
pela sua assessoria de comunicação, a Itaipu Binacional
informou não ter conhecimento do conteúdo das ações,
mas entende "que esse conjunto de ações é
mais um produto da indústria da indenização, que
tenta tirar proveito de uma situação forjada, explorando
a boa-fé dos produtores rurais".
Na nota, a binacional diz que informações preliminares
dão conta de que "tais ações teriam se baseado
em fragmentos de estudos feitos pelo Instituto Tecnológico Simepar
para a Itaipu Binacional e que esses estudos teriam sido aproveitados
de forma distorcida e manipulada, incompatível com o conjunto
dos resultados".
"O monitoramento microclimático feito por Itaipu desde 1998,
sustentado em bases científicas, não permite concluir
que a formação do lago seja responsável por supostas
mudanças climáticas na região, muito menos que
tenha causado prejuízos aos produtores", diz a nota.
Segundo a binacional, eventuais alterações climáticas
ocorridas podem ser atribuídas a variações globais
de temperatura (efeito estufa) e ao desmatamento desordenado que houve
na região, e não ao reservatório. Diz que os prejuízos
alegados inexistem. Informa ainda que, oportunamente, a Itaipu Binacional
contestará essas ações e produzirá as provas
técnicas que demonstrarão, em definitivo, "a improcedência
de tais pretensões milionárias".
Quanto aos pedidos de indenização por outros supostos
danos, a Itaipu Binacional esclarece que a mata ciliar na faixa de proteção
é uma obrigação legal, o que impede o uso privado
dessa área. E que a desapropriação da área
já foi devidamente indenizada no passado. A nota diz que a responsabilidade
pela segurança e a vigilância do lago, para evitar roubos,
contrabando e tráfico de drogas, é da Polícia Federal
e não da binacional.
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