Agora
é científico. A "morte súbita dos citros"
(MSC), doença que está se alastrando pelos laranjais do
norte de São Paulo e do Triângulo Mineiro, é causada
por um agente infeccioso. Essa recente descoberta dos pesquisadores
é preocupante. Pôs em alerta os governos e os citricultores
do país, maior produtor mundial da fruta e do suco.
A hipótese de que a manifestação da doença
estivesse associada a fatores climáticos e ao tipo de solo deixou
de prevalecer com as experiências, com duração superior
a um ano, realizadas pelo Fundecitrus (Fundo de Defesa da Citricultura)
na cidade de Comendador Gomes (MG), primeira localidade onde a MSC foi
identificada, em 2001.
Essa hipótese era considerada a mais provável pelo fato
de a doença estar aparentemente restrita às duas regiões
dos Estados de São Paulo e Minas Gerais. Mas os experimentos
provaram que a MSC é transmissível e causada por um agente
infeccioso ainda desconhecido.
Estragos
Já são 1,5 milhão de plantas doentes no país.
No final de 2001, eram cerca de 330 mil. O Estado de São Paulo
tem 190 milhões de plantas; Minas Gerais, 11 milhões.
Os prejuízos financeiros beiram os R$ 80 milhões. No início
do ano passado, eram 11 os municípios com registro da doença.
Agora, são 23, sendo 12 municípios em São Paulo
e 11 no Triângulo Mineiro. Varreduras estão sendo feitas
fora da área de prevalência da doença para identificar
eventuais novos focos.
"A MSC pode estar muito além do que a gente imagina. Podemos
estar atrasados em relação a ela", disse Renato Bassanezi,
pesquisador do Fundecitrus que estuda principalmente a epidemiologia
(formas de propagação). Um desafio dos cerca de 40 pesquisadores
envolvidos nos estudos é saber qual o agente causador (etiologia).
A hipótese principal é que sejam mutações
genéticas do vírus da "tristeza", uma doença
que arrasou os laranjais paulistas nos anos 40 (século passado).
O inseto pulgão-preto seria o principal vetor da MSC.
Combate
Atualmente existem 12 centros de pesquisa empenhados na causa, sendo
nove no Brasil e os outros três na França, na Espanha e
nos Estados Unidos, onde até o Departamento de Agricultura está
envolvido. A comprovação de que a MSC é transmitida
por mudas contaminadas e produzidas sem os devidos cuidados ocorreu
a partir de experiências com tecidos de plantas infectadas e também
sadias,
retiradas de regiões sem incidência da MSC. A contaminação
ocorreu. Pior: os sintomas da doença podem demorar até
13 meses para aparecer.
Assim, mudas sobre porta-enxertos, mesmo as tolerantes à MSC,
apesar de não apresentarem os sintomas, podem estar contaminadas
e espalhar a doença.
Limão-cravo
A MSC, por enquanto, só atingiu os pés de laranja enxertados
em limão-cravo. O problema é que 82% as enxertias no parque
citrícola brasileiro estavam sendo feitas com essa técnica,
que é utilizada desde 1950, uma vez que ela é resistente
ao vírus da "tristeza".
Bassanezi disse que, a longo prazo, o objetivo das pesquisas é
descobrir porta-enxertos que substituam o limão-cravo. Experiências
como essa já estão ocorrendo com três tipos: as
tangerinas "sunki" e "cleópatra" e o citrumelo
"swingle". Esses tipos se mostram toleráveis à
MSC, mas não existe ainda comprovação científica,
uma vez que a observação se deu em campo.
Em pomares em que as plantas enxertadas sobre limão-cravo estavam
com a doença, as árvores com esses outros tipos não
tinham a MSC. Em um ano, houve redução de 49,34% na produção
de porta-enxertos de limão-cravo em 396 viveiros telados de São
Paulo e do Triângulo Mineiro. Mas a substituição
esbarra na falta de sementes dos outros tipos de porta-enxertos.
O Brasil depende da importação, que precisa ser regularizada
pelo governo federal.
Governo federal libera 21,5% do que prometeu
Embora a instrução
normativa do Ministério da Agricultura sobre a MSC justifique
as medidas nela contidas pela "importância econômica
da cultura de citros para o Brasil, que constitui uma das principais
fontes de divisa para o país", o governo liberou 21,5% do
que havia sido prometido.
O Brasil é o maior exportador de suco de laranja concentrado
do mundo e produz 29% da laranja mundial. Dos R$ 10 milhões prometidos
pelo ministério aos produtores e Estados, foram liberados até
agora R$ 2,15 milhões para o Fundecitrus fazer a varredura na
região norte de São Paulo (R$ 1 milhão ontem).
A instituição espera mais R$ 4,35 milhões.
A assessoria de imprensa do Ministério da Agricultura informou
que mais R$ 3 milhões serão repassados neste mês
para os Estados, por meio de convênios. Quase 65% da verba orçada
para combater a doença vem da iniciativa privada (R$ 23 milhões).
São Paulo investe R$ 2,6 milhões.
Segundo o Fundecitrus, o Ministério da Ciência e Tecnologia
aprovou uma verba de R$ 1,7 milhão para a MSC -R$ 200 mil já
foram liberados e, até o fim do ano, as instituições
de pesquisa devem receber nova parcela, ainda sem valor definido. Os
órgãos privados envolvidos preparam propostas para levar
à Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado de São Paulo).
O secretário da Agricultura e Abastecimento de São Paulo,
Antônio Duarte Nogueira, tenta viabilizar o financiamento pela
Fapesp.
NOVIDADE: Rentabilidade
fica maior
Ortanique é citro que produz fora de época
Outubro é
um mês em que há poucos frutos cítricos no mercado
e, por isso, é uma época em que eles alcançam altos
preços. Nesse contexto, a ortanique, uma cultivar cítrica
híbrida entre laranja e tangerina, aparece como boa alternativa
ao produtor, que pode obter maior rentabilidade.
A cultivar foi importada há quatro anos via Uruguai -ela é
originária da Jamaica- e implantada no país desde então
pela Embrapa Clima Temperado com produtores parceiros em Rosário
do Sul e Santa Margarida do Sul. Eles já estão na segunda
colheita. "A produtividade hoje é de duas toneladas por
hectare, mas o potencial é de 40 toneladas por hectare a partir
do sexto ou sétimo ano", afirmou Roberto Pedroso de Oliveira,
37, pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).
A combinação entre esse potencial à produção
fora da época despertou o interesse de agricultores, principalmente
de São Paulo e do Rio Grande do Sul.
A fruta
Quando está madura, a ortanique -ou tangor- tem um sabor bem
doce, balanceado com a acidez. Seu tamanho é de médio
a grande, com um achatamento semelhante ao da tangerina. Ela é
muito abundante de suco, geralmente 50% de seu peso total. Além
disso, se plantada sem cultivares polinizadores próximos, a ortanique
não tem semente.
A coloração atualmente obtida nos pomares do Rio Grande
do Sul é um alaranjado forte, quase avermelhado. Segundo Oliveira,
da Embrapa, isso se deve ao clima mais ameno das regiões onde
ela é produzida. "A diferença entre as temperaturas
diurna e noturna dá cor à laranja e ao citro."
Por isso, segundo o pesquisador, a fruta seria obtida com cor semelhante
se fosse produzida em Capão Bonito (sul de SP), região
com temperaturas mais amenas do que Ribeirão Preto, grande pólo
produtor. "Em Ribeirão, a produtividade poderia ser maior,
mas em Capão Bonito é que a cor fica superior." (FABÍOLA
SALANI)
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