DOENÇA SE ALASTRA NOS LARANJAIS POR INFECÇÃO

Paulo Peixoto

Agora é científico. A "morte súbita dos citros" (MSC), doença que está se alastrando pelos laranjais do norte de São Paulo e do Triângulo Mineiro, é causada por um agente infeccioso. Essa recente descoberta dos pesquisadores é preocupante. Pôs em alerta os governos e os citricultores do país, maior produtor mundial da fruta e do suco.
A hipótese de que a manifestação da doença estivesse associada a fatores climáticos e ao tipo de solo deixou de prevalecer com as experiências, com duração superior a um ano, realizadas pelo Fundecitrus (Fundo de Defesa da Citricultura) na cidade de Comendador Gomes (MG), primeira localidade onde a MSC foi identificada, em 2001.
Essa hipótese era considerada a mais provável pelo fato de a doença estar aparentemente restrita às duas regiões dos Estados de São Paulo e Minas Gerais. Mas os experimentos provaram que a MSC é transmissível e causada por um agente infeccioso ainda desconhecido.


Estragos
Já são 1,5 milhão de plantas doentes no país. No final de 2001, eram cerca de 330 mil. O Estado de São Paulo tem 190 milhões de plantas; Minas Gerais, 11 milhões. Os prejuízos financeiros beiram os R$ 80 milhões. No início do ano passado, eram 11 os municípios com registro da doença. Agora, são 23, sendo 12 municípios em São Paulo e 11 no Triângulo Mineiro. Varreduras estão sendo feitas fora da área de prevalência da doença para identificar eventuais novos focos.
"A MSC pode estar muito além do que a gente imagina. Podemos estar atrasados em relação a ela", disse Renato Bassanezi, pesquisador do Fundecitrus que estuda principalmente a epidemiologia (formas de propagação). Um desafio dos cerca de 40 pesquisadores envolvidos nos estudos é saber qual o agente causador (etiologia). A hipótese principal é que sejam mutações genéticas do vírus da "tristeza", uma doença que arrasou os laranjais paulistas nos anos 40 (século passado). O inseto pulgão-preto seria o principal vetor da MSC.

Combate
Atualmente existem 12 centros de pesquisa empenhados na causa, sendo nove no Brasil e os outros três na França, na Espanha e nos Estados Unidos, onde até o Departamento de Agricultura está envolvido. A comprovação de que a MSC é transmitida por mudas contaminadas e produzidas sem os devidos cuidados ocorreu a partir de experiências com tecidos de plantas infectadas e também sadias,
retiradas de regiões sem incidência da MSC. A contaminação ocorreu. Pior: os sintomas da doença podem demorar até 13 meses para aparecer.
Assim, mudas sobre porta-enxertos, mesmo as tolerantes à MSC, apesar de não apresentarem os sintomas, podem estar contaminadas e espalhar a doença.


Limão-cravo
A MSC, por enquanto, só atingiu os pés de laranja enxertados em limão-cravo. O problema é que 82% as enxertias no parque citrícola brasileiro estavam sendo feitas com essa técnica, que é utilizada desde 1950, uma vez que ela é resistente ao vírus da "tristeza".
Bassanezi disse que, a longo prazo, o objetivo das pesquisas é descobrir porta-enxertos que substituam o limão-cravo. Experiências como essa já estão ocorrendo com três tipos: as tangerinas "sunki" e "cleópatra" e o citrumelo "swingle". Esses tipos se mostram toleráveis à MSC, mas não existe ainda comprovação científica, uma vez que a observação se deu em campo.
Em pomares em que as plantas enxertadas sobre limão-cravo estavam com a doença, as árvores com esses outros tipos não tinham a MSC. Em um ano, houve redução de 49,34% na produção de porta-enxertos de limão-cravo em 396 viveiros telados de São Paulo e do Triângulo Mineiro. Mas a substituição esbarra na falta de sementes dos outros tipos de porta-enxertos.
O Brasil depende da importação, que precisa ser regularizada pelo governo federal.


Governo federal libera 21,5% do que prometeu

Embora a instrução normativa do Ministério da Agricultura sobre a MSC justifique as medidas nela contidas pela "importância econômica da cultura de citros para o Brasil, que constitui uma das principais fontes de divisa para o país", o governo liberou 21,5% do que havia sido prometido.
O Brasil é o maior exportador de suco de laranja concentrado do mundo e produz 29% da laranja mundial. Dos R$ 10 milhões prometidos pelo ministério aos produtores e Estados, foram liberados até agora R$ 2,15 milhões para o Fundecitrus fazer a varredura na região norte de São Paulo (R$ 1 milhão ontem). A instituição espera mais R$ 4,35 milhões.
A assessoria de imprensa do Ministério da Agricultura informou que mais R$ 3 milhões serão repassados neste mês para os Estados, por meio de convênios. Quase 65% da verba orçada para combater a doença vem da iniciativa privada (R$ 23 milhões). São Paulo investe R$ 2,6 milhões.
Segundo o Fundecitrus, o Ministério da Ciência e Tecnologia aprovou uma verba de R$ 1,7 milhão para a MSC -R$ 200 mil já foram liberados e, até o fim do ano, as instituições de pesquisa devem receber nova parcela, ainda sem valor definido. Os órgãos privados envolvidos preparam propostas para levar à Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
O secretário da Agricultura e Abastecimento de São Paulo, Antônio Duarte Nogueira, tenta viabilizar o financiamento pela Fapesp.

NOVIDADE:
Rentabilidade fica maior
Ortanique é citro que produz fora de época

Outubro é um mês em que há poucos frutos cítricos no mercado e, por isso, é uma época em que eles alcançam altos preços. Nesse contexto, a ortanique, uma cultivar cítrica híbrida entre laranja e tangerina, aparece como boa alternativa ao produtor, que pode obter maior rentabilidade.
A cultivar foi importada há quatro anos via Uruguai -ela é originária da Jamaica- e implantada no país desde então pela Embrapa Clima Temperado com produtores parceiros em Rosário do Sul e Santa Margarida do Sul. Eles já estão na segunda colheita. "A produtividade hoje é de duas toneladas por hectare, mas o potencial é de 40 toneladas por hectare a partir do sexto ou sétimo ano", afirmou Roberto Pedroso de Oliveira, 37, pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária). A combinação entre esse potencial à produção fora da época despertou o interesse de agricultores, principalmente de São Paulo e do Rio Grande do Sul.


A fruta
Quando está madura, a ortanique -ou tangor- tem um sabor bem doce, balanceado com a acidez. Seu tamanho é de médio a grande, com um achatamento semelhante ao da tangerina. Ela é muito abundante de suco, geralmente 50% de seu peso total. Além disso, se plantada sem cultivares polinizadores próximos, a ortanique não tem semente.
A coloração atualmente obtida nos pomares do Rio Grande do Sul é um alaranjado forte, quase avermelhado. Segundo Oliveira, da Embrapa, isso se deve ao clima mais ameno das regiões onde ela é produzida. "A diferença entre as temperaturas diurna e noturna dá cor à laranja e ao citro."
Por isso, segundo o pesquisador, a fruta seria obtida com cor semelhante se fosse produzida em Capão Bonito (sul de SP), região com temperaturas mais amenas do que Ribeirão Preto, grande pólo produtor. "Em Ribeirão, a produtividade poderia ser maior, mas em Capão Bonito é que a cor fica superior." (FABÍOLA SALANI)




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