O
Brasil possui a maior área de floresta tropical, a maior biodiversidade,
o maior manancial de água doce e um dos mais extensos litorais
do mundo. Grande parte desse patrimônio natural ainda conserva
a sua integridade, mas o uso não-sustentável desses recursos
nas últimas décadas vem causando sua rápida deterioração.
Perguntamo-nos se essa degradação do meio ambiente seria
essencial, ou mesmo benéfica, ao crescimento econômico,
ou se crescimento e progresso social se favoreceriam mais de uma maior
proteção ambiental. No momento em que o Brasil enfrenta
a imensa tarefa de reduzir a desigualdade social, uma questão
fundamental é se as preocupações com o meio ambiente
dificultam ou promovem as prioridades sociais. Há quem veja as
perdas ambientais como o preço a pagar pelo rápido crescimento
econômico. Entretanto dados referentes ao Brasil e outros países
não demonstram correlação entre degradação
ambiental e expansão econômica. Ao contrário, os
períodos de declínio econômico parecem coincidir
com uma maior deterioração ambiental. Maiores cuidados
com o meio ambiente em áreas-chave parecem favorecer o crescimento
e o progresso social.
Considere-se, por exemplo, o caso da atividade econômica na Amazônia.
A maior parte do desmatamento -cerca de 17 mil km2 ao ano, durante os
últimos dez anos- resulta da queima da floresta para formação
de pastagens. Contudo a pecuária emprega menos de 10% dos 20
milhões de brasileiros que vivem na Amazônia e causa um
dano ambiental muito grande, reduzindo os recursos disponíveis
para outras atividades menos devastadoras. Muitos dos pobres da região
dependem dessas outras atividades: a pesca, a caça e a extração
de borracha e de frutos. Incentivos ao uso sustentável da terra,
como a promoção de sistemas agro-silvo-pastoris, reflorestamento
e manejo florestal podem ser conseguidos através da adoção
de um sistema de direitos de propriedade e de instrumentos de gestão
ambiental que estimulem práticas mais sustentáveis.
Considerem-se também os custos causados pela degradação
ambiental à agricultura e a saúde. No período de
1998/99, o governo gastou cerca de US$ 3,3 bilhões para socorrer
cerca de 10 milhões de vítimas da seca no Nordeste. Isso
poderia ter sido evitado em parte com uma melhor gestão dos recursos
hídricos. Enchentes também são um fenômeno
recorrente, agravado pelos incessantes desmatamento e erosão
do solo. No Sudeste, os altos níveis de poluição
nas áreas metropolitanas têm forçado companhias
de abastecimento de água a buscar água potável
em regiões distantes dos locais de fornecimento, aumentando os
custos de distribuição. Ou seja, além do seu custo
ambiental, a poluição da água se traduz em maior
custo para os pobres.
Os períodos de declínio econômico parecem coincidir
com uma maior deterioração ambiental.
Apesar dos
óbvios benefícios de um meio ambiente de melhor qualidade,
as escolhas são frequentemente difíceis na maioria dos
países. O uso sustentável e a preservação
não podem prevalecer enquanto ganhos de curto prazo forem apropriados
por poucas pessoas e os custos, às vezes muito maiores que os
benefícios, afluírem para uma grande e dispersa população.
Por esse motivo, ações governamentais para proteger os
investimentos no meio ambiente são de grande importância.
Além da preservação de áreas críticas,
algumas outras prioridades de política pública merecem
atenção.
Primeiro, o fornecimento de serviços básicos e educação
em áreas com uma densidade populacional relativamente alta melhora
a vida das pessoas e desencoraja o seu avanço sobre novas áreas
florestais e sobre o litoral, onde esses serviços não
existem. Educação e serviços básicos também
proporcionam à população técnicas sustentáveis,
como novos métodos de extração de madeira com baixo
impacto ambiental, que garantem o seu sustento sem danificar o meio
ambiente.
Segundo, a criação de direitos de propriedade poderia
ser uma forma eficaz e duradoura de contribuir com a proteção
do meio ambiente, por meio de incentivos de mercado que alterem o comportamento
das pessoas em favor de atividades ambientalmente sustentáveis.
O importante é criar incentivos, além de leis e regulamentações,
que tornem o uso sustentável dos recursos mais atrativo, principalmente
para os que podem obter ganhos imediatos com a má exploração
dos mesmos. Terceiro, um mercado maior para produtos ambientalmente
corretos poderia tornar as florestas mais valiosas. A Finlândia
e a Costa Rica conseguiram isso, em parte, ao permitirem que as madeireiras
rotulassem a madeira extraída sustentavelmente como "certificada
ambientalmente". A experiência mostrou que os mercados importadores
estão dispostos a pagar um pouco mais por produtos obtidos de
forma ambientalmente sustentável.
O Brasil tem feito progressos na promoção da preservação
e do uso sustentável do patrimônio natural. Mesmo assim,
restam apenas 7% da mata atlântica original; mais de 15% da floresta
amazônica já foi destruída e, no cerrado, mais de
50% do bioma foi de alguma forma alterado. Dada a magnitude de suas
desigualdades sociais, o Brasil precisa mobilizar todos os recursos
disponíveis e utilizá-los na promoção do
avanço social. Aumentar a prioridade para a proteção
ambiental, além de beneficiar o meio ambiente, é também
uma maneira efetiva de promover o progresso social.
Vinod
Thomas, economista, é diretor do Banco Mundial para o Brasil
|