OS ESCOLHIDOS
SAIBA QUEM SÃO OS RECÉM FORMADOS QUE FICAM COM AS MELHORES VAGAS E POR QUE ELES FAZEM A DIFERENÇA

Edson Valente

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Ganhar vaga depende do "conjunto da obra"

Ser trainee é o principal objetivo da maioria dos recém-formados, mas só uma pequena elite obtém vaga nos programas que formam futuros gerentes, diretores e presidentes das empresas. Qual o segredo para ser escolhido?
Monica Pinto, 30, gerente de recrutamento e seleção da Unilever, que tem um dos programas de trainees mais concorridos (na última seleção, foram 15.500 para 33 vagas), dá algumas dicas. Diz, por exemplo, que não busca experiência e nenhum tipo de habilidade específica desenvolvida. Mas fluência em inglês é essencial.
"Trabalhamos com um conjunto de competências, como empreendedorismo, criatividade, capacidade analítica e perfil para trabalho em equipes", afirma.
Os processos de seleção para essa posição chegam a durar três meses. Envolvem dinâmicas de grupo, entrevistas e painéis em que os candidatos resolvem casos práticos sob os olhares atentos de altos executivos da organização.

Peneira
Programas mais disputados atraem milhares de concorrentes, para um número de vagas que raramente ultrapassa três dezenas.
O primeiro corte usualmente é feito pela internet, como no caso da American Express, que teve 8.000 inscritos para oito vagas no processo seletivo de 2002.
Os candidatos responderam pela rede a uma série de perguntas iniciais. Quem não tinha inglês fluente e bons conhecimentos de informática foi eliminado.
Só nessa fase foram reprovadas 6.400 pessoas. Os restantes, convocados para um teste de inglês e de conhecimentos gerais.
A etapa seguinte, que envolveu dinâmicas de grupo, procurou identificar as chamadas competências ligadas a comportamento, como capacidade de comunicação, liderança e vivência internacional, conta Sergio Nery, 48, gerente de RH da empresa.
Philip Orloff, 24, formado em administração mercadológica pela ESPM (Escola Superior de
Propaganda e Marketing), acredita que seu "background" europeu o ajudou a ser selecionado. Descendente de russos e ingleses, já esteve no continente por três vezes.
Ele passou a integrar o programa em maio de 2001 e hoje é supervisor de relacionamento.
Marcelo Azevedo, 24, hoje analista sênior de marketing da Credicard, também se beneficiou da vivência internacional. Morou na Inglaterra dos oito aos dez anos. "Isso contribuiu para minha formação. Sou uma pessoa extrovertida, principalmente por ter tido uma educação aberta."
Para Azevedo, sair em busca de experiência também auxilia a passar pela seleção. "Trabalhei em cinco companhias antes de me formar", ressalta. "Quando concorri ao trainee, tinha uma postura mais profissional."
Nem todos os programas estabelecem limite de idade ou de tempo de formado. O Grupo Pão de Açúcar, que busca pessoal qualificado para gerenciar lojas, é um exemplo. "Queremos profissionais amadurecidos, equilibrados que tenham controle sobre suas emoções.Eles devem estar preparados para administrar conflitos".
Os objetivos da empresa "casaram" com a trajetória de Fernanda Salles, 40. Após cursar biologia na PUCCamp Pontifícia Universidade Católica de Campinas), desistiu da área e, em seguida, montou uma loja de bebidas importadas.
Depois de perder um filho, partiu para a Inglaterra, onde ficou por um ano e meio. Quando voltou ao Brasil, optou por buscar um programa de trainees, nove anos depois de graduada.
O trainee recebe direcionamento na carreira, desde que tenha comprometimento e objetivos definidos", diz Salles, que hoje é diretora-regional do Barateiro (rede do grupo).

Treinamento
As organizações acenam com uma série de benefícios para atrair os mais qualificados. Os salários, por exemplo, são "polpudos". Na Unilever o trainee recebe R$ 2.500 por mês; no Citibank, R$ 2.800. Na Natura, há aumento durante o programa: de R$ 2.355, para R$ 2.944 depois de um ano.
Uma outra vantagem oferecida é o treinamento. Na Credicard, há palestras com todos os diretores e desenvolvimento de projetos especiais.
"Seu desenvolvimento mais acelerado é esperado. Afinal, não selecionamos potenciais tão grandes e os submetemos a tanto treinamento para que sejam meros burocratas na organização", diz Marilene Corona, gerente de RH.

Selecionados colecionam atributos

Os jovens escolhidos geralmente reúnem atributos. É o caso da trainee da Natura Flávia Galvão, 23. Além de um estágio na empresa júnior do Ibmec -outra característica valorizada pelos selecionadores é a participação em atividades e projetos acadêmicos-, ela morou na Filadélfia (EUA), onde estudou inglês. Também desenvolveu expressividade em um curso de teatro.
"Sou muito dinâmica", afirma. Tantos atributos lhe renderam um "difícil" problema: optar pela empresa em que iria trabalhar. Além da Natura, Galvão passou em outros três processos.
Saber trabalhar bem em equipe, outra competência valorizada pelas companhias, não se aprende só em ambientes de trabalho mas também em situações informais, como a prática de um esporte.
Recém-aprovada no programa de trainees da Alcoa, Caroline Zulueta, 21, diz que ter jogado vôlei, com
frequência, dos 12 aos 19 anos, foi fundamental ao aperfeiçoamento dessa característica.
"Aprendi a trabalhar sob pressão, a reunir esforços para ganhar um jogo e que é preciso muito trabalho conjunto e individual para chegar a um resultado", conta.
Por ter morado em São Paulo, Brasília e no Rio de Janeiro, acredita também que adquiriu a capacidade de se adaptar facilmente a novos ambientes.

Dez características para ser selecionado

1. Relacionamento interpessoal: pessoas que tenham facilidade em trabalhar em equipe levam vantagem. Os recrutadores observam, por exemplo, se o candidato sabe ouvir os colegas
2. Percepção global: os profissionais que as companhias buscam precisam ter visão de conjunto e de futuro, analisando uma determinada situação sob diversos ângulos
3. Determinação: quem titubeia fica no meio do caminho. Estabelecer metas e persegui-las com confiança e pré-requisito para ser recrutado
4. Clareza na comunicação: não basta ter conhecimento: saber disseminá-lo é fundamental. Expressar um pensamento com coerência e objetividade invariavelmente faz a diferença na seleção. Para tanto, torna-se imprescindível outra carcterística: rapidez e raciocínio lógico
5. Impacto e influência: Uma grande idéia pode passar desapercebida se o seu autor não tiver força para convencer os outros de que ela é realmente boa. alto poder de persuasão conta muito na avaliação do candidato
6. Gestão de mudanças: O ambiente empresarial exige profissionais que se adaptem com facilidade a novas situações
7. Aprendizado: É necessário estar sempre em busca de novos conhecimentos. O caráter inovador deve estar associado a criatividade e empreendedorismo
8. Foco em resultados: Além do conhecimento profundo do negócio, as empresas pedem orientação para o resultado
9. Controle: Trabalhar com bom humor e saber manter as emoções sob controle é exigido sobretudo para o nível gerencial, que frequentemente tem que administrar conflitos
10. Vivência Internacional: Ter contato com diferentes culturas propicia um grau de maturidade desejável para os futuros líderes de uma companhia.

 Folha de São Paulo, Empregos, 20 de janeiro de 2002, p.E.4.



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