Prezado
ministro, li a seu respeito no The New York Times. Assombrei-me. Houve
uma época em que estivemos simultaneamente na política.
O senhor era o Daniel, em Havana, e eu era chamado de bruxo em Brasília
quando chefiava o Gabinete Civil dos generais Ernesto Geisel e João
Baptista Figueiredo. Outro dia o Luiz Carlos Prestes e o Gilberto Freyre
diziam que a sua gestão no Planalto parece-se com a minha. Os
dois não entendem nada de poder, deixei-os falar, mas decidi
escrever-lhe. O senhor está a caminho de um suicídio político.
Está afrontando, ao mesmo tempo, três leis do poder. Veja:
1) A lei do homem-forte. O senhor apresenta-se como homem forte e mau.
Ninguém foi tão forte como o professor Cardoso no governo
Itamar, sempre com sorriso de aeromoça. Eu era temível,
admito. De mau, ninguém me acusou. O homem poderoso atrai adesões.
O mau, sicários. Os adversários do poderoso tentam enfraquecê-lo.
Os inimigos do mau precisam liquidá-lo. Ser forte e mau é
sinal de pouca inteligência. Amedrontar é coisa fácil
e tediosa. As pessoas vão se cansar de ter medo do senhor.
2) A lei das esferas. As esferas do poder são três: o palácio,
a máquina e o Congresso. Ninguém pode mandar nas três.
Olhe em volta: os seus inimigos no palácio são muito mais
perigosos que os do Congresso. No governo do Figueiredo, eu tive dificuldades
com a turma das cavalariças. Ouso arriscar: o senhor terá
dificuldades com a turma das peladas. Pior: com a turma que fará
ponto no gabinete paulista da Presidência. O homem poderoso não
manda em esfera nenhuma. Tem quem mande com ele. Falo de gente como
Petrônio Portella ou Luís Eduardo Magalhães, craques.
Há nos seus prepostos muita teatralidade e pouco preparo. O senhor
confunde base de apoio com tropa de choque. Quando usa um grande político
para agir como mastim, arruina o aliado e prejudica o governo.
3) A lei das aparências. Eu rachava banheiro com o ministro Reis
Velloso. Nunca reclamei. Nunca viajei com o presidente. Aliás,
não viajava. Aquilo que o senhor fez no Paraná com o seu
filho foi uma extravagância. O senhor sabe que nunca conseguiu
presidir o PT paulista. O doutor Celso Daniel, que me foi apresentado
pelo Mário Covas, contou porque esse cargo não lhe foi
oferecido, mas não posso revelar as cousas que ouço por
cá. Outro dia, horrorizado, o Tancredo me mostrou uma cena na
qual o senhor sentou-se à cabeceira de uma mesa, presidindo reunião
de governadores. Não mostre importância, nossa espécie
é frágil. Basta uma canetada e acabou-se.
Despeço-me porque vou com o Castello Branco a um jantar do Jânio
Quadros em homenagem ao Che Guevara.
Golbery do Couto e Silva
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