Diplomata experiente
e polêmico, por sua independência intelectual, autor de livros importantes
sobre a história da diplomacia, Paulo Roberto de Almeida, de seu posto
em Washington, elaborou o chamado "decálogo da transição", com conselhos
para o PT sobre como atravessar a transição com o mínimo de sobressaltos.
Pela oportunidade, fica o registro resumido:
1) Unificar o discurso Pequenos chefes e porta-vozes auto-assumidos
têm de ser alertados para os efeitos nefastos da chamada "dupla linguagem".
Em operações militares não pode haver dualidade de comando, e a arte
da política tem regras muito semelhantes.
2) Falar ao país, não ao partido A primeira palavra não deve ser aos
seus seguidores, mas à nação, ainda que esse pronunciamento contenha
palavras de agradecimento a todos aqueles que tornaram possível a vitória.
Esqueça por um momento os grupos sociais e os problemas locais, com
exceção de uma menção ampla aos excluídos e marginalizados, pois os
interesses começam justamente a divergir quando se mencionam categorias
específicas da população.
3) Dirigir-se ao mundo, seletivamente Cabe ao novo presidente, cuidadosamente,
planejar eventual viagem pré-posse (...), não necessariamente aos pontos
que oferecem soluções aos problemas, mas àqueles que representam a própria
fonte desses problemas. (...) Se nos dedicarmos (a combater a exclusão
social) de forma consequente, com ou sem a cooperação internacional
(...), o prestígio externo será o resultado de termos alcançado aquele
objetivo, não a consequência de qualquer novo ativismo no plano externo.
4) Tranquilizar os agentes econômicos (...) Essa confiança não cresce
apenas com a abertura ao diálogo, mas sobretudo com a capacidade demonstrada
de tomada de decisão. Há um momento, portanto, em que as consultas precisam
ser interrompidas, e a decisão, anunciada. 5) Designar os principais
assessores, depois negociar. (...) Caberia designar a equipe econômica
que vai começar a trabalhar na primeira fase da transição, dando-lhe
inteiro respaldo e preservando-a das inevitáveis barganhas das demais
escolhas. Uma vez feito isso, pode-se sentar para ouvir (...) sem negociar
o que é essencial, isto é, a capacidade governativa no núcleo central.
6) Recompor um programa de governo (...) De preferência será curto,
preciso, objetivo, sem adjetivos, indicando claramente para onde vai
dirigir-se a ação governamental, numa primeira fase pelo menos. Lembre-se
de que não será possível contentar a todos, e assim certos problemas
não serão necessariamente tocados. Isso não deve ser motivo de angústia,
pois ninguém espera, sobretudo os mais esclarecidos, que a nova situação
resolva tudo em seis meses. 7) Atender a circunstâncias excepcionais
(...) Determinados bens públicos devem ser preservados além e acima
das querelas ideológicas, e a situação econômica é um deles. Eventualmente,
medidas excepcionais serão necessárias, antes mesmo da assunção ao poder,
o que exige, antes de mais nada, o abandono da postura do "eu não disse?"
em favor da adoção de uma atitude de responsabilidade compartilhada
no acolhimento dos custos -inclusive políticos- derivados de medidas
restritivas ou de ajuste emergencial. 8) Indicar as linhas do discurso
de posse (...) Destacar mais os elementos afirmativos da futura ação
governamental do que as críticas à herança recebida (ainda que algum
"exagero" seja aqui compreensível). 9) Estruturar as bases do apoio
congressual (...) O novo governo, no Executivo ou no Legislativo, deve
estar primariamente interessado na eficácia de suas ações, não na sua
conformidade a qualquer cartilha política do passado. A clareza de propósitos
deve servir como elemento de pressão (contras as pressões fisiológicas)
do ponto de vista da opinião pública. 10) Preparar-se para o pior, manter
a mensagem otimista (...) A desconfiança no valor da moeda é o sinal
mais claro do desconforto com a mudança, que não resulta necessariamente
da obra de "especuladores" ou outros conspiradores externos. Tudo isso
precisa ficar claro para a nova maioria, que não pode perder o sangue-frio
e sair buscando "bodes expiatórios" e culpados de ocasião. (...) Por
isso caberia preparar-se para o pior, isto é, para uma deterioração
ainda maior da situação econômica nos próximos meses, ainda que mantendo
um discurso otimista -ou moderadamente realista -sobre a superação da
presente fase de turbulências.
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