INVESTIMENTO EM SERVIÇO CRIA MAIS EMPREGO

Fátima Fernandes

Os seis setores que têm mais potencial para criar empregos no país são os de serviços (saúde, educação e lazer), o agropecuário, o de madeira e mobiliário, o de calçados, o de vestuário e a indústria do café. Já as indústrias de automóveis, caminhões e ônibus, de equipamentos eletrônicos, de produtos químicos, de artigos plásticos e de borracha têm menor potencial para empregar.
Essa é a conclusão de um estudo do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) feito com 41 setores da economia brasileira, com dados do IBGE de 2001, atualizados em fevereiro deste ano. O banco considerou a hipótese de cada setor receber uma injeção de R$ 10 milhões na produção.
O trabalho, coordenado por Sheila Najberg, chefe do departamento econômico do BNDES, mostra que os setores mais intensivos em mão-de-obra e aqueles nos quais predominam as pequenas
empresas -como os serviços prestados à família (saúde, educação e lazer)- são mais capazes de elevar o número de vagas.
Para fazer o ranking dos setores mais e menos empregadores, o estudo considerou o emprego direto, o indireto e o criado a partir do efeito renda (aumento do consumo em outros setores como resultado da elevação da renda).
Se estimulado com R$ 10 milhões, o setor de serviços prestados à família criaria mais empregos diretos (625) do que indiretos (118). O número de vagas abertas com o efeito renda seria de 338. Na indústria de petróleo e gás, o impacto já seria menor nos empregos diretos (13) do que nos indiretos (95). Os postos de trabalho criados com o efeito renda somariam 356.
No estudo anterior, de 2001, o setor de vestuário aparecia em primeiro lugar como o maior criador de vagas, com 1.575 empregos. Neste ano, aparece em quinto lugar, com 885 empregos.
"Os setores mais fortes em pequenos estabelecimentos, que exigem mão-de-obra menos qualificada e pagam salários menores, tendem a ter mais participação no aumento do emprego, caso do setor de serviços prestados à família", diz Najberg.
Em comparação com o estudo de 2001, não há mudanças significativas na posição dos setores no ranking. O que se nota é uma diminuição no potencial de vagas criadas com o estímulo à produção. O setor agropecuário, que, pela simulação deste ano, tem potencial para criar um total de 986 empregos, tinha, há dois anos, capacidade de abrir 1.193 vagas.
"A abertura da economia brasileira e a globalização exigem que as empresas trabalhem cada vez mais de forma eficiente, o que, muitas vezes, significa a substituição de mão-de-obra por máquinas. A tendência, portanto, é o emprego diminuir mesmo", afirma Najberg.

Baixo potencial
O setor da construção civil, citado normalmente como um dos principais criadores de emprego na economia, não aparece nem entre os dez primeiros -ocupa o 16º lugar (ver quadro).
Esse setor, segundo o BNDES, é mais gerador de emprego direto (185) do que de emprego indireto (95). Por ser uma atividade que emprega mão-de-obra não-qualificada e com baixos salários, segundo Najberg, tem menos impacto na economia.
A indústria automobilística, que acabou de receber um estímulo do governo para elevar a produção (a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados), figura como um dos setores que têm menos potencial de empregar, segundo o BNDES.
Um acréscimo de R$ 10 milhões na produção criaria um total de 361 empregos -15 diretos, 126 indiretos e 220 pelo efeito renda. A explicação é que esse é um dos setores que, ao se modernizar, substitui cada vez mais a mão-de-obra por equipamentos. É um setor, porém, que paga salários mais elevados e que, por isso, é capaz de ter impacto na demanda de outros setores da economia.
Apesar de esse estudo ser uma referência para os rumos de uma política industrial para o governo, a chefe do departamento econômico do BNDES afirma que o emprego não deve ser o único critério utilizado para definir uma política setorial para o país.
"O governo não pode ter uma visão simplista e apoiar só os criadores de emprego. É preciso estudar a estabilidade do emprego, a sua remuneração e a sua qualidade. A indústria automobilística, por exemplo, não cria grande número de vagas, mas estimula outros setores", afirma Najberg.
Se quer elevar as suas exportações para melhorar o saldo da balança comercial, o país deve estimular os setores capazes de aumentar as vendas externas. "O emprego é uma variável importante para a política do governo, mas não pode ser a única."
Os maiores geradores de emprego, diz Fábio Silveira, economista da MB Associados, são os setores que têm baixa produtividade e baixos salários e que agregam pouco valor à economia.
"Esses setores não podem, portanto, servir de critério único para definir uma política setorial", afirma. "É preciso considerar também a competitividade, o padrão tecnológico e o potencial exportador dos
setores." A cadeia produtiva deve ser considerada, diz, na hora de o país preparar a política setorial.
 
QUANTOS EMPREGOS SÃO GERADOS COM INJEÇÃO DE R$ 10 MILHÕES NA PRODUÇÃO
 
Saiba quais são os tipos de empregos criados em alguns setores
Total de vagas por tipo
Fonte: BNDES
 
Refino de petróleo é o que mais propaga vagas
As montadoras de veículos não são grandes criadoras de empregos diretos e indiretos se estimuladas, como mostra ranking do BNDES que identifica os setores com maior ou menor potencial de abrir novas vagas. Mas, considerando só o setor industrial, essas companhias estão entre as três com mais condições de multiplicar empregos, segundo estudo elaborado pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
A indústria de automóveis, caminhões e ônibus ocupa a terceira colocação em um ranking de 16 setores industriais com potencial de multiplicar o número de vagas. Para cada emprego criado nesse setor, são abertas outras 9,3 vagas em outros setores, segundo a UFRJ. A primeira colocada é a indústria de refino de petróleo -a cada emprego criado no setor, outros 20,3 são abertos em outros setores. Em segundo lugar aparece a indústria de óleos vegetais -a cada emprego criado, outros 12,5 são abertos em outros setores.
As indústrias com menor potencial de multiplicar empregos no país são a farmacêutica e de perfumaria, a de borracha e a de autopeças. Para cada emprego criado nesses setores, são abertas 3,3 vagas em outros.
David Kupfer, coordenador do grupo de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da UFRJ, que elaborou o ranking, informa que o multiplicador de emprego é maior nos setores que utilizam mão-de-obra intensa na fabricação do seu insumo.
Exemplo: a indústria de óleo de soja é de capital intensivo, portanto emprega pouco. Só que ela é grande consumidora de soja -a produção do grão é intensiva em mão-de-obra. A indústria de borracha, diz Kupfer, não é grande multiplicadora de emprego porque compra insumo da indústria química, que emprega pouco.
Apesar de alguns setores industriais terem potencial de multiplicar empregos, as indústrias estão a cada ano perdendo a capacidade de empregar. "A busca da modernização e da competitividade é contínua, e o emprego vai sempre sofrer os efeitos disso", afirma Kupfer.
A indústria, na sua análise, tende a ter cada vez menos capacidade de absorção de emprego. "O emprego terá de ser criado primordialmente no setor de serviços. Para minimizar o impacto na indústria, deve haver políticas compensatórias do governo." O programa Primeiro Emprego do governo Lula, diz, segue essa linha.
 
Política setorial tem de mirar exportação
O emprego não deve ser o único quesito considerado pelo governo para traçar uma política setorial. Além da criação de novas vagas, é preciso considerar o impacto que o estímulo a um setor terá nas exportações e na conquista de novas tecnologias. Essa é a opinião de economistas e empresários.
"A questão do emprego é chave dentro das discussões setoriais. Mas é preciso considerar o impacto que um incentivo a determinado setor tem na economia", afirma Sérgio Mendonça, diretor-técnico do Dieese. "Ao mesmo tempo é possível escolher a tecnologia mais empregadora."
Mendonça diz que o tempo continua feio no Brasil na questão do emprego. A tendência, segundo ele, é a de todos os setores, especialmente o industrial, continuarem com a política de poupar trabalho, como uma das estratégias para reduzir os custos.
David Kupfer, coordenador do Grupo de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), concorda. "A indústria ainda está sob o desafio de aumentar a competitividade não só para exportar mais mas para sobreviver no mercado interno", afirma. Isso quer dizer que a indústria tem pouco potencial de absorção de emprego.
O setor de serviços será cada vez mais, na análise dos economistas, a salvação dos emprego no país. Nos últimos 17 anos, o número de ocupados nesse setor aumentou em 1,69 milhão na Grande São Paulo, segundo o Dieese. No mesmo período, a indústria cortou 309 mil postos de trabalho.
O aumento nas vagas, segundo Mendonça, foi puxado pelos serviços auxiliares (como os de limpeza e segurança) e especializados (como os das consultorias). O emprego nesses setores cresceu 320% e 138%, respectivamente, de 1988 a abril deste ano, segundo levantamento do Dieese.
Apesar de o setor de serviços aparecer como um dos que têm maior potencial de gerar emprego, diz Mendonça, não é possível esperar que o governo só invista nesse setor. "As indústrias mais dinâmicas são as que menos criam empregos, mas elas têm também um papel estratégico na economia. O desafio é fazer uma política industrial que considere todas essas questões."
Para Fábio Silveira, economista da MB Associados, uma boa política industrial precisa ser articulada com um conjunto de setores. Não pode considerar apenas um setor.
 
ONDE ESTÁ O EMPREGO
Por setor, com carteira assinada, em 2001
Alimentos e bebidas
908.358
Artigos de vestuário e acessórios
421.138
Couro e artefatos de couro
312.343
Produtos de metal - exceto máquinas e equipamentos
305.357
Produtos têxteis
282.449
Artigos de borracha e plástico
272.624
Produtos de minerais não metálicos
272.403
Máquinas e equipamentos
271.013
Produtos químicos
267.743
Móveis e indústrias diversas
265.820
Veículos automotores, reboques e carrocerias
263.087
Artigos de madeira
209.145
Metalurgia básico
191.584
Edição, impressão e reprodução de gravações
189.076
Máquinas, aparelhos e materiáis elétricos
122.124
Pastas, papel e produtos de papel
121.823
Material eletrônico e aparelhos de comunicação
62.536
Coque, refino e petróleo e combustíveis
47.118
Outros equipamentos de transporte
37.637
Instrumentação para uso médico hospitalar
36.718
Máquinas para escritório e equip. de informática
17.034
Produtos do fumo
15.705
Reciclagem
10.344
Total da indústria de transformação
4.903.179
Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)
 
OCIOSIDADE - Na indústria paulista varia entre 20% e 24% neste mês. Há um ano estava entre 18% e 20%
DOMÉSTICOS - Havia 5,9 milhões de empregados domésticos no país em 2001, o que representava 7,8% da população ocupada. Em 1992, representava 6,7%
AUTOPEÇAS - Dos 263.087 empregos gerados pela indústria automobilística, 56% estão na produção de peças e acessórios
AGRÍCOLAS - Os trabalhadores em atividade agrícola representavam 20,6% do pessoal ocupado em 2001. Em 1992, participavam com 28,3%
Fonte: FIESP, IBGE E MTE
 



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