PROGRAMA PIB ZERO

 


O brasil está perdendo a valiosa carona do crescimento da economia mundial. O desempenho da economia brasileira tem permanecido abaixo da expansão mundial nos últimos anos, fato que se acentuou no governo Lula.
Como era esperado, os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados ontem registraram crescimento próximo de zero. Verificou-se uma ligeira recessão, com taxa negativa de 0,2%, o que corresponde a uma redução do PIB por habitante de 1,5%, tendo em vista o crescimento populacional de 1,3% em 2003. É o pior resultado desde 1992.
A comparação entre o Brasil e o mundo mostra a disparidade de comportamentos. Desde 1996, o Brasil cresceu abaixo da economia mundial sem exceção. Em 1995, primeiro ano do primeiro governo FHC e na esteira do sucesso do Plano Real, a economia se expandiu ligeiramente acima do resto do mundo: 4,2%, contra 3,7%, respectivamente, perfazendo uma diferença de 0,5 ponto percentual. Isso ocorreu a despeito da crise do México, que afetou negativamente as economias emergentes.
Desde então o Brasil esteve sempre abaixo da média mundial. No primeiro ano do segundo governo FHC, o hiato chegou a 2,8 pontos percentuais. Isso refletiu o efeito devastador que as crises da Ásia e da Rússia tiveram sobre os emergentes e sobre o Brasil em particular, acelerando a crise cambial em 1998/99.
A maior frustração do governo Lula é que há, de fato, um espetáculo de crescimento em cartaz em vários países e regiões do planeta, mas não no Brasil. Pela primeira vez, desde muitos anos, não se verifica uma recuperação sincronizada entre as principais economias do mundo. Some-se a isso que a própria Argentina, que entrou na maior crise de sua história em 2000/02, registra recuperação, pelo menos por enquanto.
Em contraste com essa retomada do nível de atividade mundial, o Brasil continua patinando. Considerando o número de ontem do IBGE, a diferença entra as taxas de expansão do Brasil e da economia mundial chegou a 3,4 pontos percentuais. Isto é, o Brasil praticamente estagnou em um ano no qual a economia mundial cresceu 3,2%, segundo dados do FMI.
Os melhores cenários para 2004 indicam que o Brasil pode crescer 4%. Apesar das evidências recentes de que o consumo não está retomando de forma vigorosa no primeiro trimestre, é prematura a revisão para baixo dessa taxa, como ensaiada por alguns analistas nesta semana.
O próprio relatório do IBGE contém informações úteis a respeito da recuperação da economia. No último trimestre de 2003, a expansão relativamente ao trimestre anterior chegou a 1,5%, depurados os fatores sazonais. Isso equivale a uma taxa anualizada de 6,1%.
O problema reside, contudo, na possibilidade de manter o ritmo do final de 2003 ao longo de 2004 em uma conjuntura interna mais adversa. Isso porque, no plano da política macroeconômica, prevalece um excesso de cautela e conservadorismo na política monetária, conforme revelado na ata do Copom divulgada na última quinta-feira. E, no plano microeconômico, foi abalada a impressão que se tinha no final de 2003 de que o governo teria uma agenda minimamente articulada para estimular as inversões produtivas.
Essa combinação perversa de excesso de conservadorismo na política monetária aliado à desorientação na política microeconômica mina as condições de crescimento sustentado. É o que poderia ser chamado de Programa PIB Zero.
Somem-se, por fim, a eclosão do escândalo Waldomiro e seus efeitos negativos sobre a capacidade de coordenação do núcleo duro do governo para entender por que surgem dúvidas quanto ao fôlego do crescimento em 2004.
E lembre que mesmo o melhor cenário, de uma expansão de 4%, corresponde apenas a acompanhar a projeção que se tem para o crescimento da economia mundial neste ano.


Gesner Oliveira, 47, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
 



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