ALTERAÇÕES NA AGRICULTURA IRRIGADA

 
Rebert Coelho Correia*
Nos anos 90, os cultivos irrigados sofreram forte alteração no Pólo Juazeiro-BA/Petrolina-PE. A causa foi a especialização regional da agricultura. Nas áreas irrigadas dos perímetros públicos (43.000 ha), de 1991 a 1999, os plantios com fruticultura perene salta-ram de 14 para 76%. Esse crescimento é acompanhado por outro, também expressivo: as áreas com fruteiras já são maiores entre as propriedades familiares (14.396 ha) do que entre empresas (8.027 ha). A mesma dinâmica é observada nas áreas irrigadas gerenciadas pela iniciativa privada. 
Nesse período, os cultivos temporários foram reduzidos drasticamente. O feijão, por exemplo, entre 1994 e 1999, teve diminuído seus plantios em mais de quatro vezes: de 6000 ha para 1241 ha. O tomate também teve sua área plantada reduzida de 3242 ha para 784 ha. No cenário futuro do agronegócio nordestino, essas tendências devem se acentuar. 
Um dos motivos a sustentar essa previsão é a geração de renda proporcionada pela agricultura irrigada: de 10 mil reais/ha, na cultura do melão, a 30 mil reais/ano, na uva. O ambiente nordestino, por sua vez, é uma vantagem competitiva que tem os fruticultores em relação a outras áreas produtoras do país. O clima quente seco e quente, aliado às técnicas de irrigação permitem a obtenção de ciclos sucessivos de produção, colheitas em qualquer época do ano e produtividades acima da média nacional. 
Outro motivo é a repercussão que a fruticultura irrigada na economia local e regional. Petrolina, desde a implantação do primeiro perímetro irrigado, em 1968, vem apresentando taxas anuais de crescimento econômico acima de 10%. A participação do Produto Interno Bruto (PIB) do município também tem crescido em relação ao Estado de Pernambuco: em 1970, era de 1,89%; dez anos depois, havia passado para 2,98%; em 1991, o índice já era de 3,41%; e, seis anos após, em 1997, saltava para 9,63%. Petrolina ainda tem uma taxa de urbanização de 77% e mais da metada da população economicamente ativa (51%) está em-pregada na agricultura - o comércio emprega 39,75% e a indústria, 8,7%. 
O crescimento da participação da agricultura familiar na fruticultura irrigada é diferente daquela observada com as empresas. Primeiro, porque sinaliza um processo de desconcentra-ção da renda na economia regional. Segundo, o crescimento se deu com a diversificação dos cultivos. As empresas, em geral, se especializaram no plantio de uva e , principalmente, de manga. No período de 97 a 99, o Brasil exportou 19.193 t de uva: 95% delas foram colhidas em pomares do Polo de Juazeiro e Petrolina. E, das 116.320 t de manga exportadas, 85,5% têm a mesma origem. Do valor obtido com essas exportações, 104 milhões de dólares, nada menos que 95 milhões de dólares (91%) foram capitalizados por produtores do Polo.
Nas propriedades familiares, os cultivos são mais diversificados e voltados para o mercado interno. Nelas, são exploradas banana, coco, goiaba e, em menor escala, manga e uva. A banana, pode ser considerada a cultura símbolo da transição dos produtores familiares dos cultivos temporários para a fruticultura perene.
Isto porque, bastam sete meses para que as plantas já estejam produzindo e gerando capital. O cultivo da banana é quase exclusivo dos agricultores familiares: 4000 ha contra apenas 431 ha na área de empresários. 
A principal vantagem da fruticultura do Submédio do São Francisco em relação à das demais regiões
produtoras do país advém, principalmente, da possibilidade de obtenção de ciclos sucessivos de produção, possibilitando colheitas em qualquer época do ano em virtude da adaptação e do comportamento diferenciado das plantas nessas condições climáticas. Assim sendo, o ciclo fenológico da planta é antecipado e mediante o manejo da irrigação e a realização de podas programadas ou indução floral, possibilita a produção durante todo o ano e uma produtividade média acima da obtida nas demais regiões produtoras brasileiras. Isso permite aproveitar as melhores oportunidades de preços, ocupando as "janelas" de mercados externo e interno, deixadas pelas regiões produtoras concorrentes (Silva & Correia, 1999).
Estas análises permitem responder as questões sobre a viabilidade da agricultura fami-liar irrigada. Este segmento produtivo foi o mais dinâmico na transformação e especialização regional na fruticultura irrigada, através da substituição de áreas antes destinadas a cultivos temporários, adaptando-se aos novos rumos econômicos e sociais, gerando alimentos, renda e emprego estável com a redução de áreas com culturas sazonais. 

Pesquisador/Manejo de Solos Embrapa Semi Árido/PE