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Segurança hídrica se atinge armazenando e usando adequadamente a água
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Fernando Braz Tangerino Hernandez
Muitos países enfrentam o desafio de manter ou não deixar diminuir as suas áreas de agricultura irrigada que possibilitam e sustentam o desenvolvimento sócioeconômico de regiões ao mesmo tempo em que garantem a oferta de alimentos ao longo do ano e dos tempos. As limitações podem vir do solo, trabalhado há séculos ou de problemas ligados a qualidade e oferta de água para mover os sistemas de irrigação. No Brasil, o desafio é o oposto, queremos e precisamos aumentar a nossa área irrigada, muito pouco perto do nosso potencial. Antes, falávamos em 30 milhões de hectares, mas os estudos conduzidos pela Esalq-USP e recentemente divulgados pela SENIR - Secretaria Nacional de Irrigação nos informa que é de 60 milhões de hectares a área potencial para agricultura irrigada e temos apenas 6 milhões hectares e assim, aproveitamos de forma limitada os efeitos multiplicadores da agricultura irrigada.
O melhor ano em termos de crescimento da nossa agricultura irrigada foi 2013, quando 280 mil hectares passaram a contar com novos sistemas de irrigação. O que vinha desenhando um cenário crescente de expansão relativa da agricultura irrigada foi interrompido em 2014 e 2015 com a crise hídrica, quando irrigantes posicionados às margens dos grandes lagos das hidrelétricas jamais imaginariam que teriam dificuldades e custos adicionais para captar a água e continuar a desenvolver a sua atividade econômica. Muitos chegaram a paralisar suas atividades dada a insegurança hídrica que lhes foi imposta, em grande parte do Brasil.
No noroeste paulista, região chamada de Grandes Lagos, não foi diferente dos irrigantes às margens do rio São Francisco por exemplo, onde muitos imaginavam que jamais teriam problemas de captação de água para irrigação porque temos o Tietê, Paraná, os rios Grande e o São José dos Dourados, além de outros de menores vazões e não represados, como o Preto e Turvo, entre tantos outros, a crise hídrica de 2014 e 2015, agora superada, mostrou toda a vulnerabilidade a que os irrigantes estão expostos e a fragilidade dos seus sistemas.
Entretanto, estudos feitos pela UNESP em 2000 apontavam que a região intralagos apresentava fragilidade hídrica com vazão específica média plurianual (Qesp) igual a 0,0878 litros/s/ha, enquanto que a necessidade média de irrigação em sistemas localizados seria de 0,6 litros/s/ha, o que na prática exigiria a escolha de locais mais adequados para se fazer a irrigação e indicava a necessidade de obras hídricas e de conservação do solo, dada a pouca disponibilidade dos recursos hídricos. Em 2013, novos estudos também conduzidos pela UNESP mapearam as microbacias da bacia do rio São José dos Dourados e confirmaram os dados anteriores e concluíram que, para que haja a expansão da área irrigada de forma sustentável, ações imediatas deveriam serem empreendidas no sentido de promover a maior permanência da água nas microbacias e isso deve ser feito com práticas de conservação do solo e barramento.
Agora os irrigantes nos perguntam se com as nascentes voltando a “brotar” água e os níveis dos rios e dos reservatórios das hidrelétricas elevados, qual o risco de uma nova crise hídrica?
Não é uma pergunta fácil de responder, a decisão sobre o consumo de água pela geração de energia e nível dos reservatórios cabe à ONS, o Operador Nacional do Sistema e mesmo com os reservatórios cheios é muito difícil ter uma resposta para esta preocupação, pois não sabemos qual será o regime de chuvas, se teremos o reaquecimento econômico com crescimento da demanda por energia e principalmente, onde e qual a fonte geradora de energia empregada. Hoje, somente o sistema Norte e Nordeste se apresentam em situação crítica de armazenamento de água.
Mas os irrigantes devem se preocupar também como podem e devem atuar para que a segurança hídrica possa ser atingida ou ao menos, mitigar os efeitos de uma possível nova alteração no regime de chuvas. Os irrigantes devem se questionar se empregam técnicas de conservação do solo ou se precisam de ajustes a serem feitos, se há erosões a serem corrigidas, se suas matas ciliares estão adequadas e todas as demais técnicas que promovam a infiltração da água no solo estão sendo empregadas adequadamente para que a água chegue ao lençol freático e assim, garantir que a nascente não “morra” mais, como vimos nestes últimos dois anos. Intervenção em talvegues degradados com projetos bem concebidos também vale para se conseguir mais água no médio e longo prazo.
E quanto aos equipamentos de irrigação, quantos irrigantes já avaliou o seu sistema alguma vez? Será que o irrigante sabe qual a capacidade real do seu sistema e com qual qualidade faz a irrigação? Não se deve iniciar qualquer programa de manejo da irrigação sem conhecer a uniformidade de aplicação da água e a lâmina líquida realmente aplicada. E estas informações são fundamentais tanto no manejo via solo, como via atmosfera, quando em um, medimos o estoque de água no solo e no outro, estimamos as perdas pelo processo de evapotranspiração.
E quanto a real necessidade de expandirmos nossa agricultura irrigada, ela deve ser feita com base em sistemas de irrigação projetados adequadamente, levando em consideração as condições locais de solo, clima, qualidade e disponibilidade de água, cultura, o que implica na escolha de emissores adequados e o respeito aos critérios hidráulicos que compõem um bom projeto de irrigação.
Segurar a água na bacia hidrográfica, projetar e instalar equipamentos adequados e aplicar água no momento e na quantidade necessária, são ações complementares que farão com que se tenha segurança hídrica á agricultura irrigada!
*Fernando Braz Tangerino Hernandez, Engenheiro Agrônomo e Professor Titular da Área de Hidráulica e Irrigação da UNESP Ilha Solteira. www.feis.unesp.br/irrigacao/irrigacao.php, divulga dicas sobre agricultura irrigada e agroclimatologia semanalmente no Pod Irrigar emhttp://podcast.unesp.br/podirrigar
Irrigazine, Ano 12, Nº 45, p. 26 e 27, março de 2016.
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