PROGRAMA DE REVITALIZAÇÃO DA FRUTICULTURA É POSITIVO,
AVALIA LUIZ FLORIANO


O Programa de Revitalização da Fruticultura completou um ano domingo passado, dia 10 de fevereiro. Lançado pelo ex-prefeito José Carlos Guisso como um instrumento para alavancar este segmento, o Programa é avaliado de forma positiva por seu mentor, o agrônomo Luiz Carlos Floriano da Silva, Secretário Municipal de Agricultura e Abastecimento, mestre pela UNESP - Ilha Solteira, doutorando pela Universidade Federal de São Carlos e vice-diretor da Escola Técnica de Jales. Eis a íntega da entrevista que ele concedeu ao Jornal de Jales...(D.R.J.)
JJ - Exatamente um ano depois do lançamento, como o senhor avalia o Programa de Revitalização da Fruticultura?
Luiz Floriano - Considerando o contexto que o Programa de Revitalização foi proposto, bem como a amplitude das ações que propunha, a avaliação é positiva, aliás, animadora face às perspectivas de médio e longo prazos. Ainda que alguns fruticultores possam sentir-se frustados, especialmente aqueles que viam o Programa Revitalização como tábua de salvação, notadamente quanto aos problemas relativos a endividamento e crédito rural, todas as proposituras registradas tiveram algum encaminhamento e evoluçãlo neste período. Pelo menos três ações agressivas de marketing a nível nacional, em feiras como a Fruteira e a Fispal em São Paulo e a ABRAS no Rio de Janeiro; a transformação da Festa da Uva em Feira de Agronegócios, substituindo a vertente de entretenimento por evento de negócios, e as articulações para implantação do sistema de Produção Integrada de Frutas que, entre outros resultados, implicará em redução de custos de produção e incremento de qualidade das frutas e viabilizando a abertura de mercado de exportação, são alguns resultados diretos do Programa de Revitalização da Fruticultura.
JJ - Embora seja um programa abrangente, uma das principais reivindicações era o equacionamento das dívidas dos fruticultores, através do Pró-Frutas. Houve resultados?
Luiz Floriano - O encaminhamento do problema do endividamento dos fruticultores necessita ser analisado no tempo e no espaço. Primeiro: graças às articulações e mobilizações decorrentes do lançamento do Programa, o Banespa prorrogou o vencimeto dos finaciamentos do final de fevereiro para novembro/dezembro de 2001 e até fevereiro de 2002, "afrouxando" a corda do pescoço do fruticultor, o que foi uma enorme vitória, com uma clara distinção do banco para a região e para a viticultura, principalmente. Segundo: a reivindicaçãode equacionamento do endividamento dos fruticultores proposta pelo plano envolvia o alongamento de prazo de pagamento com um período de carência para reorganização do processo produtivo, sem canalizar para esta ou aquela linha de crédito. Aliás, a proposta apontava para uma espécie de securitização. Infelizmente, aventada pessoalmente pelo Ministro Pratini de Moraes, a absorção do volume de dívidas no âmbito do Pró-Frutas encontrou barreiras nas normas do Banco Central e BNDS, e que operacionalmente exigia do Banespa algum grau de comprometimento, que infelizmente foi posta de lado, por decisão do Banco.
Ainda que este caminho não levou a êxito , outros foram tentados, culminando com um acerto com a Diretoria de Crédito do Banespa, contemplando o encaminhamento de propostas individuais, tratando caso a caso, o equacionamento das dívidas. Neste procedimento, a Secretaria da Agricultura disponibilizou gratuitamente os serviços de um agrônomo especializado em crédito rural e foram elaborados projetos técnicos envolvendo viabilidade técnico-econômica e renegociação de prazos, tratando individualmente quase 150 contratos. Foi o único caminho de negociação que restou, onde alguns casos estão avançando e para outros infelizmente, não foi possível acordo, restando aparentemente a via judicial.
JJ - Comparando os resultados com a possibilidade de solução acenada pelo ministro da Agricultura Pratini de Moraes, quando eteve em Jales, no ano passado, o sentimento é o de frustração por parte dos produtores?
Luiz Floriano - Acredito que a proposta do ministro demonstrou extrema boa vontade e até praticidade. Aliás, sua equipe e, em especial o Dr. Afonso Ham, coordenador nacional do Pró-Frutas. Acontece que a sua viabilização dependia de dois pontos básicos: o interesse do Banespa em adotá-la, incluindo alguns riscos e por outro lado, a necessária existência de garantias bancárias por parte dos produtores. O banco, alegando problemas de ordem legal, preferiu não assumir os riscos, e a imensa maioria dos produtores não possuem garantias para contornar o problema utilizando o problema. No entanto, realmente existiu uma imprudente euforia por parte de muitos produtores, e até mesmo nossa, vislumbrando uma solução efetiva para o problema e que, com sua inviabilização e desinteresse unilateral provocou uma sensação de frustação.
JJ - Outro ponto importante do Programa era dar uma certa homogeneidade à qualidade da fruta produzida em Jales. Este objetivo foi alcançado?
Luiz Floriano - De maneira geral, a qualidade da fruta produzida na safra de uvas de 2001 foi superior às dos dois últimos anos pelo menos. No entanto, somos humildes em creditá-la a fatores climáticos principalmente, pois ainda que algumas ações foram postas em prática, os resultados efetivos serão palpáveis em 2002 ou posteriores. O incremento em qualidade é o resultado de domínio de tecnologia, de conhecimentos, em resumo: informação, que leva algum tempo para ser implementada e colher resultados. A articulação para a implantação de ações da Produção Integrada de Frutas e o início de um trabalho sistêmico de aglutinação de produtores têm como meta o incremento da qualidade em curto e médio prazo. A formação de três grupos de viticultores no município, comprometidos num programa de melhoria da produtividade e qualidade, que semanalmente vêm reunindo-se em dias de campo, paletras, visitas técnicas e assessoria de técnico especializado em viticultura, o agrônomo Wilson Katayama, implicará em resultados efetivos já na safra de 2002. Neste trabalho, além do incremento em qualidade, com a padronização da uva, acompanhada de um bom planejamento de podas e condução, teremos uma viabilização de comercialização em grupo com possibilidade de resultados fantásticos, no curto prazo. A Produção Integrada de Frutas, envolvendo parceria com o Centro Nacional de Pesquisas de Meio Ambiente, da Embrapa, sediada em Jaguariúna, viabiliza-se um enorme avanço com resultados de médio prazo, inclusive com certificação internacional de qualidade.
JJ - E quanto ao selo de qualidade, o que é possível dizer hoje?
Luiz Floriano - O selo de qualidade faz parte de um programa mais amplo, que envolve a marca "Frutas da Região dos Grandes Lagos". Desde o lançamento do Programa de Revitalização, foi elaborado um cronograma de ações que implicavam na adoção deste Selo de Qualidade. A criação da Sociedade Frutas da Região dos Grandes Lagos, uma ONG para gerir os interesses, o marketing e demais ações mercadológicas foi o primeiro passo. A emissão do selo envolvida a elaboração de normas, a adesão voluntária de produtores aos requisitos e a implantação de um processo de verificação/certificação. Trata-se de um processo sequencial, cujas fases não podem ser atropeladas. Em 2001 foram elaboradas as normas, foi criado o selo, porém a logística requerida para sua implantação foi prejudicada justamente pela carência de uma organização básica dos produtores, com todo o trabalho de padronização é que viabilizará a sua emissão para próxima safra.
JJ - Quando se fala em fruticultura, pensa-se instantaneamente na uva como carro-chefe. À vista do Programa de Revitalização da Fruticultura, a uva continua sendo um bom negócio?
Luiz Floriano - Novamente temos que recorrer a um visão ampla e sistêmica da situação. No atual contexto econômico, que envolve extrema competitividade, viabilização da produção em escala, qualidade, etc..., qual seria a viabilidade de uma pequena empresa, seja agrícola, comercial ou industrial? A sobrevivência estará diretamente ligada a planejamento e estratégia que concilie e maximize todos os seus potenciais, vocações e pontos fortes, e um rigoroso processo de controle. E o que isto tem a ver com uva? Tudo, pois tratando a viticultura na ótica de empreendimento, temos uma das melhores, senão a melhor alternativa para uma pequena propriedade, para a agricultura familiar e para a região de Jales. É lógico que o ambiente econômico produz sérios danos àquelas propriedades e lavouras que não encontram-se no estágio gerencial e tecnológico compatível. Tratam-se de consequências idênticas àquelas observadas para uma boutique, um bar ou uma farmácia. A viticultura é econômico e socialmente melhor cultura para região, considerando sua produtividade, rentabilidade, absorção de mão de obra, competividade e perspectivas de mercado, etc. Se neste contexto, adicionarmos a instalação de parreirais com uvas sem sementes, cujos trabalhos fantásticos da Embrapa de Jales tornarão viáveis em mais dois anos, vislumbra-se um ótimo negócio pela abertura do mercado de exportação.
JJ - O senhor e o falecido prefeito Guisso vinham mantendo contatos com grandes indústrias, com a Superbom, para criar outras alternativas de colocar a produção. Em que pé está esta tratativa?
Luiz Floriano - Especificamente quanto à Superbom, o cronograma de compromissos encontra-se em execução, que inicia-se com a implantação em Jales e região de frutas destinadas à industrialização, pois ao contrário do que muita gente pensa, nossas frutas têm pouco ou nenhum aproveitamento industrial, já que a boa parte dela têm como alvo o mercado. O primeiro projeto neste sentido é a implantação de 150 hectares de maracujá, cujas mudas estão sendo formadas no viveiro de mudas da Prefeitura com previsão de implantação no campo em março. O próximo passo é a reconversão de variedade Izabel, que deverá acontecer entre julho/agosto próximos. A revisão é que já neste ano, a despolpa do maracujá seja operacionalizado em Jales, e conforme aumente a produção de matéria-prima, seja viabilizada a instalação de todo o complexo industrial aqui, que prevemos para 2003.
JJ - O JJ noticiou que o senhor liderou uma caravana para visita a indústrias de processamento de frutas em Araguari - MG. Há esperanças de que tais empresas se instalem em Jales ou absorvam a produção?
Luiz Floriano - Qualquer indústria somente de instala onde existam condições favoráveis à sua competitividade e sobrevivência no mercado, e para isto é fundamental a existência de matéria-prima. Infelizmente, hoje ainda não temos quantitativamente frutas para instalação de nenhuma grande agroindústria no município e região. Isto não inviabiliza pequenas agroindústrias, especialmente as artesanais. Em nossa planificação, primeiro necessitamos fomentar a implantação de culturas, com o cuidado e responsabilidade de estabelecimento de compromissos e comprometimento de ambas as partes, conforme o que está sendo feito com a Superbom. Qualquer implantação de agroindústria tem que ser bom para indústria, para o produtor, para o município e para quem mora em Jales. Especificamente nesta viagem a Araguari, o que buscamos foi aprender ou descobrir os caminhos que levaram aquela cidade a responsabilizar-se pelo processamento de 70% do suco de frutas vendido no país. As respostas que obtivemos apontam que estamos no caminho certo, ou seja, possuir a matéria-prima. Alguns contatos foram feitos com indústrias, porém apenas no sentido de absorção de eventual excedente, que aliás, são promissores.
JJ- Depois desta visita, o senhor aventou a possibilidade de incrementar a cultura do maracujá. Em que medida isso pode alavancar a fruticultura regional?
Luiz Floriano - O Projeto de fomento da cultura do maracujá já fazia parte do cronograma envolvendo compromissos com a Superbom. A produção de mudas já havia sido iniciada em novembro/dezembro, à partir de agrupamento dos produtores realizados em outubro e novembro. Atualmente o maracujá é a fruta com maior demanda industrial do país, haja visto um cenário de desabastecimento. O fabricante do conhecido suco Magurari está buscando frutas no Pará e Bahia para procesamento em Araguari justamente porque a produção local é insuficiente. Trata-se, portanto, de uma bela opção para o momento e que não significa dizer que é a redenção para a região. É preciso cuidado, pois um plantio desordenado pode resultar em prejuízos e frustrações. Daí o modelo adotado com a parceria com a Superbom, com o estabelecimento de compromissos pré-determinados, de área cultivada, preços, quantidades, etc. Outros produtos a serem fomentados, como a uva para suco, o tomate industrial e o abacaxi, receberão o mesmo cuidado.
JJ - O prefeito Guisso era um entusiasta do Programa de Revitalização da Fruticultura. O prefeito Caparroz tem a mesma postura?
Luiz Floriano - O prefeito Guisso tinha uma enorme visão de futuro. Por exemplo, o que fomos conhecer recentemente em Araguari, estudando os ingredientes necessários para o desenvolvimento agroindustrial e suas requeridas estratégias, Guisso não somente tinha desenhado os caminhos, como tinha certeza dos efetivos resultados.
O valor e importância da fruticultura para o desenvolvimento regional. Guisso tinha a visão conceitual de que a fruticultura é o meio para viabilidade econômico-social da pequena produção e da agricultra familiar, e esta agricultura é a solução para o enorme problema da necessidade de geração de emprego e renda, e, portanto a solução para o desenvolvimento de Jales e da região. Assim as idéias e propostas eram amarradas em projetos e programas com a perspectiva de desenvolvimento sustentável, com algum impacto de curto prazo, investimento na verdade, porém com resultados de médio e longo prazo. Exemplos: o investimento na Produção Integrada de Frutas que dará certificação para exportação de uma uva que só será produzida comercialmente em dois ou três anos, mas , o processo de certificação também demora este tempo, então o seu "start" não pode ser prorrogado; bancar a substituição de uma festa de entretenimento, a Festa da Uva por evento de negócios, a Feira da Uva, e outras ousadias para uma cidade do porte de Jales. Guisso queria abrir um jornal de circulação nacional, uma revista especializada da área agopecuária e ver o nome de Jales não no mesmo nível de outros pólos agropecuários, mas como um ponto de referência, e nestes projetos esforços não deveriam ser medidos. Nestes quase três meses de administração do Senhor José Antonio Caparroz, estamos recebendo a mesma priorização, liberdade de trabalho e atenção que tínhamos com Guisso, ressalvado o modelo de gestão da Prefeitura muito diferente dos dois e respeitada a limitação física da idade de Caparroz, que o impede de usar as mesmas metodoligias de Guisso, especialmente viagens e contatos com outras regiões.

Jornal de Jales, nº 1937, 17 de fevereiro de 2002, p.05



UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA