"PRORROGAÇÃO DE CONTRATOS DE CRÉDITO RURAL AFROUXA A CORDA NO PESCOÇO"


 
Quando o nome do engenheiro agrônomo Luiz Carlos Floriano da Silva foi anunciado como Secretário Municipal da Agricultura, os produtores e técnicos respiraram aliviados. Afinal, o cargo fôra entregue a alguém que na condição de vice-diretor da Escola Técnica de Jales, já demonstrara combinar, na medida certa, conhecimento técnico com capacidade de se fazer entender. Ou seja, não era daqueles metidos a falar "agronomês" o tempo todo.
Formado em
Agronomia pela UNESP - Ilha Solteira e em Pedagogia pela FAI - Jales, Luiz Floriano tem titulação. É mestre em área de Produção Vegetal pela UNESP - Ilha Solteira e, em fevereiro, recebeu o título de doutor pela Universidade Federal de São Carlos na área de Gestão de Qualidade.
Luizinho tem 36 anos, é casado com a professora Roseli Trevizan e é pai de Fernanda.
Ele foi ouvido pelo Jornal de Jales sobre o Programa de Revitalização da Fruticultura, do qual é o principal mentor.

JJ - A decisão do Banespa em prorrogar vencimentos de contratos de crédito rural é a primeira vitória do Programa de Revitalização da Fruticultura?
Luiz Floriano - Não resta dúvida que a prorrogação para dezembro dos contratos que venceram em fevereiro último é reflexo direto das propostas integrantes do Programa de Revitalização, aliás, o documento representou argumento decisivo no processo interno que desencadeou na decisão do Banespa, uma espécie de avalista de todo o segmento produtivo local. Noentanto a vitória deve ser creditada ao processo de mobilização do segmento, que inclusive serve de exemplo para a sociedade. Um movimento meticulosamente organizado, envolvendo a articulação de idéias e estratégias, a efetiva mobilização dos beneficiários diretos (produtores), e a adesão irrestrita das instituições regionais, da sociedade civil, entidades religiosas e especialmente da imprensa, que foi o esteio do movimento, elementos que associados detonaram o envolvimento direto dos mais diversos agentes governamentais. O envolvimento e empenho do ministro Aloísio Nunes Ferreira acionando a diretoria do banespa e Santander foi o verdadeiro catalisador no processo.

JJ - A prorrogação contempla as necessidades imediatas dos produtores?
Luiz Floriano - A prorrogação dos vencimentos desses contratos de crédito rural apenas afrouxa a corda do pescoço do empresário rural. Como pressupõe a analogia, o risco de enforcamento ainda é iminente.
A prorrogação é uma vitória porque evita ou suspende a inadimplência dos produtores e suas consequências, como por exemplo a inscrição do produtor no Serasa, no SPC, a execução e liquidação de empreendimentos e avalistas. Porém, um ingrediente imprescindível para o saneamento dos problemas financeiros, especialmente dos viticultores, ainda não encontra-se disponibilizado, que é dinheiro para o custeio da safra 2001. Sem este recurso financeiro, é possível antever um novo cenário de frustação quantitativa e qualitativa da safra de uva deste ano.
Conhecemos vários produtores que estão iniciando a poda de produção sem aplicação sequer de esterco, calcário ou fetilizantes. Alie-se a isto os problemas nutricionais e fitossanitários já acumulados e ainda aqueles que irão surgir no decorrer do período produtivo. Ainda assim, estamos otimistas, pois o fantasma da execução, temporiariamente deixa de atormentar o produtor, permitindo um fôlego para a viabilização tanto desses novos recursos como de uma eventual securitização das dívidas contraídas.

JJ - A quem o Programa de Revitalização de Fruticultura foi enviado até agora?
Luiz Floriano - Somente a organização e a mobilização da sociedade permitem ousadias inimagináveis por qualquer um dos oito integrantes da mesa na reunião, realizada em 08 de janeiro na Cooperativa de Jales. Num período de 45 dias, além de mobilização e engajamento de seres humanos descrentes com autoridades, com auto-estima em baixa e totalmente desestimulados, conseguiu-se redigir um documento histórico, um verdadeiro plano diretor para curto, médio e longo prazos, que alcançou a antesala do Presidente da República através do Ministro Aloísio Nunes ferreira, o Ministro Pratini de Moraes, o Governador Geraldo Alckimin e o secretário de Estado, João Carlos Meireles (Agricultura).
Além dessas autoridades executivas receberam e comprometeram-se com o documento, os deputados federais Júlio Semeghini e Vadão Gomes, os deputados estaduais Valdomiro Lopes, Edson Gomes, o presidente do Sebrae, Fábio Meirelles e dezenas de outras autoridades e entidades.

JJ - O programa propõe cinco ações para recuperar o setor. Se uma delas falhar, o que acontece?
Luiz Floriano - Apesar do programa como um todo representar um arrojado plano de desenvolvimento sustentado da região, que num período de tantas incertezas representa verdadeira ousadia, é no entanto, perfeitamente factível. A idéia de um fracasso do programa, ainda que parcialmente, não passa pela cabeça de nenhuma das lideranças envolvidas no movimento ou outoridades comprometidas com o programa. O que a sociedade, e em especial os produtores rurais, devem entender, é que o programa contempla ações de curtíssimo/curto prazo (financeiro) e de médio e longo prazos. Das cinco ações propostas, aquela que propõe a criação de uma entidade representativa para o setor é a única que efetivamente não pode falhar.
As demais ações, inclusive aquela que envolve questões de crédito rural têm implicações individualmente distintas a nível de produtor e de modelo de exploração rural. Já a criação da entidade possui o caráter eminentemente coletivo, que aliado ao fato de representar elemento articulador e gestor das demais ações e estratégias, poderá, na sua não concretização, comprometer ou inviabilizar o programa.

JJ - O Senhor vê a possibilidade do governo estender para os produtores de nossa região os benefícios obtidos pelos produtores do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, no sentido de alongamento de dívidas, lei sancionada pelo Presidente FHC EM janeiro deste ano?
Luiz Floriano - É preciso esclarecer que o documento solicita a isonomia no tratamento concedido aos empresários beneficiados pelos fundos Constitucionais do Centro Oeste, Norte e Nordeste, ou seja, estender o mesmo benefício que um empresário sediado por exemplo em Aparecida do Taboado obteve, com o alongamento de suas dívidas para o pagamento em até dez anos. Os nossos concorrentes sediados em Juazeiro, Petrolina ou Janaúba, além de acesso a créditos e outros incentivos fiscais virtualmente subsidiados, e que ainda assim alegam dificuldades na amortização, têm o benefícios, enquanto nós somos alijados. É importante salientar que requeremos tratamento semelhante somente no item alongamento das dívidas.
Ainda assim, sinceramente acredito que seja remota esta possibilidade. Não porque a reivindicação não seja pertinente ou justa, mas sim pelo fato de envolver aspectos político-constitucionais e esferas administrativas quase que inacessíveis.
Acredito sim numa possível securitização das dívidas, com prováveis benefícios semelhantes: transferência da dívida para o Tesouro (BNDES) e o alongamento do prazo de vencimento. Isto porque o cenário de preços aviltados, baixa remuneração e descapitalização é generalizado na agropecuária, e propostas de alongamento de dívidas costumam ser bem recebidas no Congresso Nacional onde a bancada ruralista não costuma perder tempo. Isto requer articulação e empenho de deputados federais, convencimento de autoridades monetárias e principalmente instrumentos de pressão popular, daí a importância da mobilização da categoria.

JJ - A propósito, por que nossa região não foi contemplada por este programa?
Luiz Floriano - Não saberia dizer com precisão e nem cabe a mim discutir aspectos político-constitucionais, porém o que salta aos olhos é que a lei passou pelo Congresso Nacional e aí falharam produtores rurais e representantes paulistas no Congresso.
Porém, não podemos esquecer, e isto é de conhecimento público: o poder e a influência da bancada nordestina no Congresso Nacoinal, o fato das instituições públicas e privadas paulistas serem efetivamente discriminadas em Brasília, sob o argumento que trata-se de Estado rico e os mecanismos de controle fiscal e monetário impostos pelo FMI e cumpridos à risca pelo Governo Federal.

JJ - Na sua opnião, os produtores de nossa região acreditam no Programa de Revitalização da Fruticultura ou estão céticos?
Luiz Floriano - Não tenho a petulância de afirmar que não existam produtores incrédulos e até mesmo pessoas que vinculam o movimento com estratégias políticas e por isso procuram desqualificá-lo. A unanimidade é perigosa e quase sempre condenável.
As lideranças do movimento, muitas delas calejadas, como o Sr. Wilson Donda e o próprio Yoshimitso Yoshida, cansados, segundo eles, de redigir, reivindicar e de conversar com autoridades, afirmam que este movimento é diferente. E acredito que seja diferente justamente porque não cai na irresponsabilidade de reivindicar soluções paliativas de problemas crônicos, sem atacar as verdadeiras causas. É diferente também porque busca compartilhar tarefas, inclusive àquelas pertinentes à própria categoria, e neste sentido, o maior exemplo foi o fato de escancararem à opnião pública os seus problemas finaceiros, administrativos, expondo a falta de competitividade, suas carências e limitações.
No entanto, ainda que o movimento demonstrou articulação e robustez, a mobilização da categoria pode ser incrementada. A seriedade no encaminhamento das propostas e ações, e principalmente a responsabilidade dessas lideranças em perseguir paulatinamente cada uma das metas, tende a engrossar o movimento, não somente com pessoas, mas também com idéias e desprendimento à causa.

JJ - Se tudo der certo como o Senhor espera, em quanto tempo a fruticultura se recupera?
Luiz Floriano - A recuperação da Atividade não pode ser confudida com retorno da significativa Lucratividade verificada, por exemplo, no início da década de 90 pelos viticultores e até mesmo citricultores da região. A agricultura segue religiosamente as leis da economia, gostem ou não produtores, autoridades e consumidores.
A agricultura, como qualquer atividade econômica terá que moldar-se a margens de lucro reduzidas, com lenta amortização de investimentos e principalmente incessante e muitas vezes desleais mecanismos de competição por mercados.
Tudo isto requer um elemento mais valioso que os materiais genéticos, e até mesmo crédito ou incentivos: o conhecimento. Um conhecimento que transcende a adoção pura e simples de tecnologias. Nossos produtores necessitam de um choque de gestão empresarial.
Não quero afirmar que sejam incompetentes ou ineficientes. Na verdade ainda que sejam excelentes produtores de uvas, laranja, limão, pinha, banana e outras frutas, são administradores despreparados. Justifico estas afirmação com uma constatação facilmente obtida nas estatísticas regionais: a produção de frutas da região de Jales não encontra-se em crise, em crise estão os fruticultores.
Quem tiver dúvidas, é só dirigir-se ao EDR e consultar os levantamentos da produção regional. Existe uma maneira mais fácil de constatar: preste atenção naquilo que chamamos cadeia de produção, as multinacionais, os transportadores, os atacadistas, os distribuidores, as lojas de insumos, os produtores, etc. Quem está quebrado?

 Jornal de Jales, nº 1890, 18 de março de 2001, p. 1-7




UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA