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Diz
o poeta: navegar é preciso. Digo eu: viajar e conhecer, também.
Estou em Fortaleza, em visita a um amigo. Amizade é algo para se cultivar com carinho e preservar sempre. Parto da capital às sete da manhã para visitar outro amigo, o Luís Alberto, dos tempos do Doutorado, a quem não vejo desde 1995. Duzentos quilômetros e três horas de estrada ruim, sem sinalização até Limoeiro do Norte. No caminho, inúmeros rios e córregos secos, caatinga, muita carnaúba e algumas surpresas: inúmeras fábricas instaladas, recentemente. Com Valério, seu irmão, fui conhecer o Distrito Irrigado de Jaguaribe Apodi (DIJA). São pouco mais de 2.500 hectares, sendo 1.500 irrigados por pivô central para produção de cereais e o restante por gotejamento e microaspersão, com prioridade para a fruticultura e destaque para a produção de banana e pinha. No DIJA, grandes moto-bombas transportam água do rio Jaguaribe até o canal de distribuição para, em seguida, chegar às propriedades que têm, cada uma, seu próprio bombeamento. Os custos de manutenção e operação do canal e do bombeamento principal são rateados entre os seus usuários. Confesso que o que vi me encheu os olhos, pois não esperava encontrar projetos tão bem instalados, com nível máximo de automação, sem vazamentos e com altos níveis de produtividade, resultados de boas práticas agronômicas. Um exemplo: as mudas de banana vêm de Brasília, via aérea, e são todas produzidas pela técnica de cultura de tecidos, o que significa garantia genética aliada ao principal: uniformidade e imunidade fitopatológica. Com 8-9 meses, inicia-se a produção. E isso não é tudo. Um grupo francês comprou uma grande área na região para o cultivo de uvas. Plantou? Não! Enviou um Agrônomo francês que firmou convênio com o Centro de Ensino Tecnológico - (CENTEC) e com uma empresa de irrigação local e, em área pública, implantou experimentos combinando espaçamentos, variedades e diferentes quantidades de água na irrigação. Somente com os resultados das pesquisas, feitas em parceria, em mãos começou a investir, e investir pesado, na viticultura. Ainda sobre irrigação, em 100% das propriedades usa-se a técnica de fertirrigação, ou seja, os fertilizantes são enviados para as plantas juntamente com a água, resultando em menor custo de produção e maior eficiência da adubação. Visitei também a Eletrovale, empresa especializada em projetos e montagens de sistemas elétricos e de irrigação que utiliza, inclusive, ferramentas de CAD (projetos feitos por computador). Tudo muito organizado. Mas a surpresa maior estava por vir. Conheci o CENTEC, que oferece quatro cursos: Recursos Hídricos, ênfase em irrigação e ênfase em saneamento ambiental, Tecnologia de Alimentos e Eletromecânica. Em 5 semestres o aluno se torna Técnico e com mais 2 semestres, Tecnólogo. O que mais me chamou a atenção foram a concepção e a infra-estrutura dos cursos. As aulas apresentam um componente eminentemente prático e, para tanto, os laboratórios contam com mais modernos equipamentos disponíveis, nacionais e importados. Tudo muito bem pensado. Até mesmo nas aulas de Biologia, Física e Matemática a prática prevalece e o auditório conta com todas as mídias disponíveis. Em Ilha Solteira, na UNESP, não dispomos de tais recursos. Convênios com iniciativa privada, como o dos franceses, são encorajados. Parceria parece ser a palavra-chave. Os professores recebem líquidos 2 mil reais - muito bom até dentro dos parâmetros universitários por uma jornada de 40 horas, têm no mínimo Mestrado, são jovens, motivados e sem os vícios do sistema universitário. Os alunos enxergam na iniciativa um futuro melhor e respondem com interesse aos cursos. É uma mentalidade totalmente receptiva às inovações. O CENTEC representa uma guinada radical no ensino, desvencilhado dos vícios do sistema universitário, uma mudança de mentalidade e de comportamento que, como escrevi em meu último artigo, são condições essenciais para a sobrevivência de todos. Gostei do que vi e do que senti junto a professores e alunos. Um estado com grandes distorções sócio-econômicas, certamente, necessita de mais Técnicos e Tecnólogos do que engenheiros para reverter essas distorções e as parcerias que conheci devem servir de incentivo para outros estados. Quinta-feira (22) tinha audiência com o Secretário da Agricultura Irrigada, Carlos Matos, e queria expressar a ele o quanto me deixou entusiasmado esta visita ao interior do Ceará. |
Fernando Braz Tangerino Hernandez, é Engenheiro Agrônomo e Mestre em Produção Vegetal pela UNESP-Jaboticabal, Doutor em Irrigação pela ESALQ-USP e Professor da UNESP-Ilha Solteira. |
Jornal
de Jales. Jales, 01 de agosto de 1999, n. 1807, p. 02 |
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