PALMITO
RESGATE DA CONFIANÇA


 

Fabricantes criam selo de qualidade que prevê inspeção regular das indústrias para enfrentar a concorrência dos produtores clandestinos e retomar o mercado perdido

As vendas de palmito caíram muito depois dos dois casos de botulismo ocorridos no Estado de São Paulo provocados pela ingestão do produto no primeiro semestre do ano passado. Como medida de precaução, o governo decidiu que os vidros de palmito em conserva deveriam trazer um selo de advertência recomendando para o consumidor a fervura do palmito durante 15 minutos.


Selo: recursos para evitar fraudes

O selo deveria ser usado até fevereiro de 2000, e a liberação seria feita após inspeção dos fabricantes. Até o final de fevereiro, porém, apenas 11 produtoras foram liberadas do uso do selo, e muitas indústrias não tinham sido submetidas à inspeção. 

Preocupados com o impacto do botulismo nas suas vendas, os fabricantes também tomaram iniciativas para tentar reconquistar a confiança do consumidor e regularizar o mercado. A mais importante foi posta em prática também em fevereiro.

Os fabricantes de palmito criaram uma associação, a Anfap, que contratou uma empresa de auditoria externa para inspecionar a produção das várias indústrias. As marcas aprovadas têm o direito de afixar nos vidros um selo, atestando sua qualidade.

As 32 marcas de palmito em conserva já autorizadas a usar o selo cumprem as exigências vigentes no país para a produção, que são as da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e as regras do Ibama - Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis para a extração da matéria-prima. A empresa de auditoria contratada, a norte-americana Bureau Veritas, usa critérios ainda mais rigorosos na sua inspeção, que será feita regularmente nas instalações e no processo de produção do palmito em conserva. 

A qualidade da matéria-prima entregue pelos fornecedores também é verificada. Com base na capacidade das instalações, a Bureau Veritas determina a quantidade de selos que a indústria tem condições de receber. Esse critério, como explica Milton Antunes Correa, presidente da Anfap, busca evitar que o selo seja desviado pelas empresas para palmito processado em outros locais e condições diferentes. 

Outro cuidado na emissão dos selos é a utilização na impressão de um sistema de segurança para que eles não possam ser adulterados, copiados ou usados por fábricas clandestinas. A numeração é controlada por um método pelo qual é possível identificar, com base no número, a marca do palmito e sua origem. Isso pode ser feito inclusive pela Internet, no site da gráfica que imprime os selos (http://www.tecnoformas.ind.br). 

Mesmo antes dos casos do botulismo, o mercado de palmito estava desorganizado pela concorrência da produção informal, sem controle sanitário e a partir de matéria-prima extraída clandestinamente, afirma o presidente da Anfap. A falta de confiança em relação à qualidade do produto faz com que o volume consumido no Brasil hoje seja o mesmo de 20 anos atrás, segundo Antunes Correa. 

A produção brasileira de palmito no ano passado foi de 28 mil toneladas, mas os fabricantes calculam que exista um mercado informal superior a esse volume. A extração descontrolada para fábricas clandestinas tornou rara a ocorrência das palmeiras jussara, antes comuns em áreas de Mata Atlântica. 

O controle da extração da matéria-prima será o próximo passo a ser tomado pela Anfap, depois que conseguir, com o selo de qualidade, o aprimoramento do processo industrial do palmito em conserva. Hoje quase 90% do palmito vendido são extraídos das palmeiras açaí e vêm do Baixo Amazonas, a maior parte dos abundantes palmeirais da Ilha de Marajó.

"Nessa região, se é feito um manejo adequado, com plantio de novas palmeiras para adensamento e um corte técnico, é possível a exploração por mais de 20 anos", afirma Antunes Correa. A idéia é orientar os produtores sobre os procedimentos corretos para evitar a devastação nas áreas de extração.

Valorizado agora também pelos seus frutos, o açaí tem um palmito de sabor e consistência semelhantes ao do juçara. Sua vantagem no manejo é que a palmeira perfilha com o brotamento de novos caules depois do corte. A juçara leva mais tempo para formar o palmito e é sacrificada pelo corte. A mais nova alternativa, a pupunha, tem a vantagem de ser explorada em plantios organizados. O gosto e a consistência de seu palmito, porém, são bem distintos dos demais, e, por isso, ele ainda enfrenta resistência dos consumidores acostumados com o juçara e o açaí. 

O palmito é basicamente uma iguaria do Brasil, que responde por cerca de 85% do que se produz no mundo. Apesar disso, o país já não domina as exportações do produto. A culpa é da falta de qualidade, afirma Antunes Correa. As exportações brasileiras já foram da ordem de 40 milhões de dólares por ano. Importadores franceses deixaram de comprar do país e estimularam a produção na Colômbia para abastecer seu mercado. Nos últimos anos, Costa Rica e Equador, com plantios de pupunha e preços mais baixos, tomaram conta do mercado internacional. O Brasil exporta hoje de 7 a 8 milhões de dólares por ano, quase tudo para a Argentina.
 

Odilon Guimarães, Revista Globo Rural, numero 174